Olhando em Redor

Entre dois mundos

O mês de Agosto é sempre altura do merecido descanso para muitos de nós que vivemos em Macau e de regresso ao trabalho para outros tantos. Convém também não esquecer quem está na mesma rotina de sempre, visto não ser ainda época da Semana Dourada.

O Aeroporto Internacional de Macau, por exemplo, costuma estar à pinha neste período do ano, com muitos filipinos a regressarem às suas terras de origem para o tão esperado reencontro familiar.

O meu destino foi, desta vez, muito mais distante do que o habitual, pois não fiquei num qualquer paraíso asiático. No aeroporto de Chek Lap Kok deparei-me com um egípcio que trabalha numa multinacional na Arábia Saudita, tendo já vivido no Kuwait, entre outros países do Médio Oriente. Era a primeira vez que tinha estado em Macau, por isso supus que tivéssemos viajado no mesmo “jet foil”, uma vez que se colocou imediatamente atrás de mim na fila do “check-in” para a bagagem que iria no porão do avião. Trocámos algumas impressões, numa típica conversa de ocasião, e fiquei a saber que era muçulmano. Não senti qualquer receio em apresentar-me como católico, talvez por alguma inclinação natural relacionada com minha actividade profissional.

Feitas as apresentações, dirigi o tema da nossa conversa para a religião e compreendi que tinha diante de mim um muçulmano moderado. Dei-lhe a conhecer alguns pontos de vista e procurei saber o que pensava sobre o tema. Ao dizer-lhe que já tinha lido os dois livros sagrados – a Bíblia e o Corão – perguntou-me que opinião tinha sobre o segundo? Respondi-lhe que encontrei muitos pontos em comum, entre cristãos e muçulmanos, ao contrário do que apregoam algumas organizações terroristas bastante activas na Europa, em África e no Médio Oriente.

Esboçando um ligeiro sorriso que lhe cortou a barba impecavelmente aparada, disse-me que o meu raciocínio era equilibrado porque o Criador, embora seja o mesmo para católicos e muçulmanos, tem nome diferente para ambos – Deus para nós e Alá para eles – pois também estamos a falar de diferentes civilizações, o que resulta em formas distintas, mas não totalmente antagónicas, de atingirmos o mesmo fim.

Quis ainda saber a sua opinião sobre a razão de ser tão difícil o entendimento entre sunitas e xiitas, ao que em traços gerais respondeu: «– Já vem de muito longe. Há diferenças muito difíceis de ultrapassar. Se puder haver alguma comparação possível com vocês, será algo do género que divide os católicos, os protestantes e os ortodoxos».

Não quis avançar mais com o tema, nem dizer-lhe o que pensava sobre o assunto, até porque chegava a minha vez de fazer o “check-in”. Perdemos irremediavelmente o contacto alguns minutos depois.

Passadas algumas horas, ao chegar a um determinado aeroporto do Médio Oriente, encontrei muitos cidadãos filipinos e indianos a trabalharem na zona do “duty-free”, facto que lhes permitirá oferecer melhores condições de vida a quem lhes é próximo.

Na viagem final até à Europa fiquei entretido com os filmes disponíveis a bordo, fazendo a espaços algumas pausas, durante as quais fui-me lembrando do que mais significativo aconteceu em Macau no último ano.

Senti algum desconforto por algumas agências imobiliárias, com nome na praça, tentarem influenciar o mercado com as suas previsões totalmente descabidas, umas relativas à subida de preços e outras com descidas muito aquém do espectável para a realidade do momento.

De igual forma, fiquei algo indisposto com a mentalidade tacanha tão em voga em determinados sectores da sociedade, como se Macau continuasse a ser uma aldeia, onde apesar de tudo ainda há alguns – poucos – cosmopolitas; aqueles forasteiros que ainda tentam dar um toque moderno a este pedaço de terra que tem tudo para ser um grande exemplo asiático em áreas tão diversas como o Ensino, a Educação, a Saúde, a Cultura, os Transportes, o Entretenimento e, até mesmo, o Turismo. Usando alguma ironia, ainda não entendi por que razão custa tanto atingir o grau de excelência em todas estas áreas? Acredito que o leitor já terá algumas respostas em mente, mas o que mais interessa nem é apontar o dedo ao que está mal e dificilmente se endireita, porque as férias são o necessário bálsamo para todas as “dores da alma”.

Ao aterrar na Europa, chegou a vez da tão desejada reunião familiar e dos encontros com os amigos de sempre. E como tem sido bom respirar o ar puro deste país plantado à beira-mar, assim como a brisa que sopra à tardinha impregnada do perfume das árvores, e de aproveitar a ocasião para me deleitar com as delícias gastronómicas que dificilmente encontro em Macau.

Posto isto, enquanto estiver a recarregar baterias, dirijo os meus sinceros votos de boas férias para quem está… de férias, e de bom trabalho para quem já gozou o merecido descanso ou está à espera da Semana Dourada. Sejam católicos, protestantes, ortodoxos, muçulmanos, budistas, judeus, ou de qualquer outro credo ou crença religiosa.

PEDRO DANIEL OLIVEIRA

pedrodanielhk@hotmail.com

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