Valores, o melhor sistema político

JÁ AGORA!

Valores, o melhor sistema político

A minha geração, nascida no final dos anos 70 do século passado, foi ao longo da década de 80 instrumentalizada para gostar de tudo o que provinha dos Estados Unidos e abominar o que levava a chancela da União Soviética. Na prática, os primeiros eram os bons e os segundos os maus da fita. E da fita, literalmente, pois o cinema de Hollywood foi o canal de propaganda usado para o efeito pretendido.

Como dos derrotados não reza a história – até porque esta é geralmente escrita pelos vitoriosos – a queda do Muro de Berlim, em 1989, é episódio revestido de troféu, para glorificar a vitória da Europa Ocidental sobre a Europa Oriental, como se tivesse sido cravada a última estaca no coração dos vampiros de Leste.

E ao longo dos anos fomos vivendo com esta ideia de que o modelo capitalista era o salvador das pátrias e o garante de maior igualdade social.

Bem vistas as coisas, de facto, sem ovos não se fazem omoletes e no Leste ovos era coisa que já escasseava, uma vez que já se havia comido quase todas as galinhas e até crianças serviram de refeição no Holodomor de Josef Stalin. Mas depois veio o disparate: ao capitalismo aliou-se o liberalismo económico, sem regras, o salve-se quem puder.

Para emendar a mão, engordaram-se os Estados com a constituição das Autoridades reguladoras disto e daquilo, como se já não existissem os Institutos fiscalizadores dos sectores da actividade económica. E agora ao que se assiste é a uma bandalheira, em que deixou de se perceber onde começam e param os limites regulares e fiscalizadores dos Governos, das Autoridades e dos Institutos, para além das grandes corporações muitas vezes funcionarem como verdadeiros Estados dentro do Estado, corrompendo quem governa mandatado com o voto do povo.

Em Moscovo retive duas frases de uma guia turística, professora de História, na casa dos vinte anos: “Lenine representa o Comunismo bom, Stalin o Comunismo mau”, “Nos tempos da União Soviética havia dinheiro mas não havia bens, hoje há bens e não há dinheiro”. Claro está que quando questionada se preferia voltar ao passado, respondeu que apesar de tudo hoje se vive muito melhor na Rússia. É que embora actualmente quase tudo tenha de ser pago, nada falta nas escolas, nos hospitais e nas prateleiras dos supermercados.

Foi então que pensei: “E se no tempo da União Soviética o mundo não tivesse sistematicamente bloqueado as redes de fornecimento de bens a Moscovo? Pelos vistos até havia dinheiro para gastar…”.

Confesso que deixei a Pátria dos Czares bastante mais elucidado do que vivera até então, desejando que o povo russo não se deixasse embriagar pelo Ocidente. Aliás, na Faculdade de Jornalismo da Universidade Estatal de Moscovo, disse a quem quis ouvir que os russos não devem importar e adaptar à sua realidade modelos políticos estrangeiros, mas continuar a aperfeiçoar o seu sistema político. Na linha, por exemplo, do que a China vem fazendo nos últimos anos. Pois que Putin e Xi Jinping fiquem no poder por muitos mais!

Quem me conhece sabe que sou assumidamente de direita (ou o mais correcto será dizer: assumidamente conservador!) mas tal condição não pode ser razão para ignorar o bom que existe em todos os regimes, mesmo nos regimes de esquerda. Lembro que ainda não há muitas semanas o Partido Comunista Português votou ao lado de todos os partidos de direita contra a eutanásia e já o havia feito em relação a outras medidas fracturantes de carácter social.

Um amigo dizia há dias que na realidade a divisão esquerda-direita começa a estar ultrapassada, pois o mais importante são os valores. Se olharmos com neutralidade para o mapa político mundial, chegamos à conclusão que em todos os regimes, independentemente se mais ou menos capitalistas, há pontos positivos e negativos. O importante é manter os valores, os costumes e as tradições, sendo que o bem-estar de vida dos povos será naturalmente garantido pela força do trabalho. Até porque, segundo São Josemaría Escrivá, o trabalho santifica!

N.d.R.:Artigo publicado em primeira mão na rede social Facebook, no dia 20 de Agosto de 2020.

José Miguel Encarnação

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