Filosofia, uma dentada de cada vez (76)

É o Homem naturalmente religioso?

A natureza do Homem faz dele um ser racional e social. Ora, isto também faz dele um ser religioso?

Se formos pelo mundo fora e explorarmos os seus recantos mais remotos, provavelmente descobriremos que cada cultura tem uma forma de crença religiosa. O fenómeno religioso encontra-se onde quer que haja seres humanos. E isto é um facto que também é estudado pela filosofia. De facto, o Homem é o único ser capaz de ser religioso; é o único ser no mundo que anseia por algo maior e que acredita em alguma divindade.

E de onde vem esse anseio e crença? Da vontade humana e do seu intelecto.

A sua vontade, apesar de já alcançar certos bens, sempre ansiou por algo mais. O intelecto torna-o capaz de ir para além do mundo visível – torna-o receptivo para o que é infinito.

Os antropólogos e etnólogos reconhecem a existência da religião, do mesmo modo que os filósofos e teólogos. Aristóteles (384-322 a.C.) ensinou-nos: “Todos os homens estão convencidos da existência de Deus”. Clemente de Alexandria (150-215 d.C.) disse: “Não existe nenhum grupo de agricultores, nómadas ou citadinos que possam viver sem terem fé num ser superior”. Henri Bergson (1859-1941) afirmou: “No passado existiram sociedades sem ciência, arte ou filosofia. Mas não existiram sociedades sem religião”.

Todas as religiões são o reconhecimento de algo ou de Alguém maior que o Homem. O historiador britânico católico Christopher Dawson (1889-1970) escreveu no seu livro “Religion and Culture” (Religião e Cultura): “O que é então a natureza específica dos fenómenos religiosos? Todas as religiões são baseadas no reconhecimento de uma realidade sobre-humana, que de alguma maneira o Homem tem consciência e que através da qual ele deverá de algum modo orientar a sua vida.

A existência de uma tremenda realidade transcendente, a que nós chamamos DEUS, é a fundamentação de todas as religiões em todos os tempos e no seio de todos os povos”.

No século VI a.C. começaram a aparecer religiões universais. As religiões do Extremo Oriente, especialmente o Hinduísmo e o Budismo, acreditam que a divindade é uma realidade absoluta e que todos os homens têm que se identificar com ela, e na qual se dissolverão depois de um período de purificação. As religiões do Médio Oriente (que também se espalharam para o Oeste, como o Judaísmo, o Cristianismo e o Islão) acreditam em Deus, com o qual se podem relacionar através de diálogo, pacto, amor ou obediência.

Uma observação cuidadosa das religiões mostra-nos que têm algumas características em comum. 1– Um credo que explica não apenas o quê ou quem é a divindade, mas também o lugar que o Homem e o mundo ocupam. 2– Há um culto ou devoção que inclui orações e rituais. 3– Há um código moral que define as normas de comportamento.

Quando se estuda a influência da religião na sociedade através dos séculos, descobrimos os muitos benefícios que a religião nos trouxe.

“A religião nas suas formas mais elevadas exerceu uma profunda influência no desenvolvimento da cultura humana. Na esfera reconhecida da moralidade, apresentou motivos poderosos para uma conduta correcta. Foi a principal inspiração da música, poesia, arquitectura, escultura e pintura; foi a influência dominante da formação da literatura permanente. Em todas as antigas civilizações emergentes os principais representantes e elementos transmissores do máximo conhecimento da cultura foram os mais altos oficiais encarregados dos rituais religiosos. A religião tem sido uma força poderosa na vida das nações, cultivando no coração do Homem uma procura por coisas melhores, um saudável toque de felicidade, esperança, alegria, resignação em face às calamidades, perseverança perante as dificuldades e prontidão para um serviço voluntário generoso, resumindo um espírito de optimismo e de moral elevado, sem o qual nenhuma nação poderá elevar-se à grandiosidade” (Aiken, C.F. “Religion”, in The Catholic Encyclopedia, http://www.newadvent.org/cathen/12738a.htm).

Mas as religiões não provocaram muitas guerras? Trataremos deste tópico na próxima vez.

Pe. José Mario Mandía

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