“Eu sou o Alfa e o Ómega – diz o Senhor Deus – Aquele que é, que era e que há-de vir, o Todo-Poderoso”

Deus é visível na criação

«No princípio existia o Verbo;

o Verbo estava em Deus;

e o Verbo era Deus.

No princípio Ele estava em Deus.

Por Ele é que tudo começou a existir;

e sem Ele nada veio à existência.

Nele é que estava a Vida

de tudo o que veio a existir.

E a Vida era a Luz dos homens.

A Luz brilhou nas trevas,

mas as trevas não a receberam»

(Jo 1:1-5)

Assim começa o evangelho do apóstolo João, que nos ilustra o modo da criação de Deus, feita pelo verbo, a palavra, o som, a vibração, a fonte criativa do Criador. Neste evangelho sobre Jesus Cristo podemos entender que Jesus foi gerado por Deus, e co-autor na criação do mundo com o seu Pai. Em Génesis, Deus também nos diz não estar sozinho nesse momento: «Depois, Deus disse: Façamos o ser humano à nossa imagem, à nossa semelhança, para que domine sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu, sobre os animais domésticos e sobre todos os répteis que rastejam pela terra» (Gn 1:26).

Ouvimos muitas vezes e reflectimos sobre esta imagem: que uma das provas da existência de Deus é a sua própria criação. Jesus falou-nos dela e por vezes a exaltou: «Porque vos preocupais com o vestuário? Olhai como crescem os lírios do campo: não trabalham nem fiam! Pois Eu vos digo: Nem Salomão, em toda a sua magnificência, se vestiu como qualquer deles» (Mt 6:28, 29).

A Criação está presente em equilíbrio desde a célula mais ínfima, até à sua infinita extensão por todo o Universo, cuja ciência procura balizar, mas ao que parece ainda não tem parâmetros para o Todo – o Alfa e o Ômega.

É fascinante ver que não só o gerado, como o não gerado, o que se cria por vezes num momento, nos aparece com harmonia e equilíbrio em toda a vertente da composição estética e do que se entende e se sente como belo – a harmonia e equilíbrio de cor, da proporção das formas, de texturas, da função, do mecanismo, do seu todo – e traz-nos muitas vezes um momento de reflexão e contemplação.

Imagine estar em casa, à janela vendo a chuva cair e tudo o que ela produz nesse momento, o que cria, que não estava presente antes: a água espelhante no pavimento, as gotas que se formam no vidro da janela criando uma textura bonita e harmoniosa e, mesmo quando alguma dessa água escorre pelo vidro, movida pela gravidade, tudo isto tem um movimento, uma forma e uma aparência que nos é agradável, pois Deus dá-nos sempre diversidade e beleza.

Um raio no céu, seguido de um ruído estrondoso, por vezes assusta-nos, mas de seguida contemplamos a beleza dessa luz e energia que se cria no tecto celeste, no raio seguinte, e como este se propaga em direcção ao solo, como os veios de um rio que procura o mar, como os ramos de uma árvore que se elevam ao céu, e a nada disto somos indiferentes.

No livro do Génesis, a Bíblia dá-nos uma introdução de como Deus criou o mundo e tudo o que nele habita, numa introdução e visão simplificada de Pai para filho, à dimensão do homem feito “criança”, e do seu discernimento e capacidade intelectual de compreensão, perante o mistério do desconhecido, o mistério da vida. O homem de fé não deve permitir que o seu intelecto o interrogue em demasia sobre estas questões, ou entre em conflitos de descrença, pois isso o afastará de Deus.

Talvez por isso Jesus nos tenha alertado que é preciso voltar a ser criança para se entrar no Reino de Deus, aquela criança que acredita indubitavelmente no seu Pai, não o julga, e sabe que ninguém lhe quer mais, senão Ele: «Naquele momento, os discípulos aproximaram-se de Jesus e perguntaram-lhe: “Quem é o maior no Reino do Céu?” Ele chamou um menino, colocou-o no meio deles e disse: “Em verdade vos digo: Se não voltardes a ser como as criancinhas, não podereis entrar no Reino do Céu. Quem, pois, se fizer humilde como este menino será o maior no Reino do Céu. Quem receber um menino como este, em meu nome, é a mim que recebe”» (Mt 18:1-5).

Picasso disse um dia: «Levou-me quatro anos para pintar como Rafael, mas uma vida para pintar como uma criança».

Apesar de não podermos colocar de lado o contexto histórico e cultural da época em que a Bíblia foi escrita, sinto que a mensagem de Deus é intemporal e abrangente a todas as gerações, dentro do Plano de Deus para o Homem. Através do seu filho Jesus Cristo, Deus fez-se presente, deu continuidade ao seu plano e propósito, encaminhando-nos a Ele, numa união através do seu Filho.

«E a verdade é que tudo o que foi escrito no passado foi escrito para nossa instrução, a fim de que, pela paciência e pela consolação que nos dão as Escrituras, tenhamos esperança» (Rm 15:4). «De facto, toda a Escritura é inspirada por Deus e adequada para ensinar, refutar, corrigir e educar na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e esteja preparado para toda a obra boa» (2Tm 3:16, 17).

Curioso também são as várias passagens de ordem científica que se encontram ao longo das escrituras: «Ele estende o setentrião sobre o vácuo e suspende a terra sobre o nada» (Jó 26:7).

«Todos os rios correm para o mar, e o mar não se enche. Para onde sempre correram, continuam os rios a correr» (Ec 1:7).

«Pela fé, sabemos que o mundo foi organizado pela palavra de Deus, de modo que o que se vê provém de coisas não visíveis» (Hb 11:3).

Assim a religião devia ligar os homens ensinando-os a aceitar e respeitar as diferenças do seu semelhante.

A própria etimologia da palavra religião nos dá esse caminho – do Latim: re-ligare, pois todo o Homem foi feito através da mesma “fórmula”, Deus deu-nos o mundo, e os sentidos para o desfrutar e usufruir da sua beleza e poesia: o vento sopra, beija-nos a face, mas não se vê; o céu distante reflecte-se no mar e aproxima-se de nós; o perfume das flores não nos deixa indiferentes, e sentimos a emoção dos seus aromas; o sabor do mel pede sempre mais uma colher e um filho nos braços, faz-nos sentir que abraçamos o mundo!

E a verdade é que sem nos apercebermos todo o Homem possui essa “fórmula de Deus” que está em toda a sua criação e que se apresenta sempre repleta de beleza, detalhe e em harmonia com o todo envolvente, a chamada “Geometria Divina”, ou “Geometria Sagrada”.

Os egípcios terão sido a civilização que deixou o grande legado dessa ciência que os gregos foram beber e deram continuidade, mas a história diz-nos que o “berço” da geometria remonta à Índia antiga e Babilónia (um exemplo da denominada geometria divina, na antiga Índia, esta incorporada no símbolo “Sri Yan” usado na meditação).

Desde a longínqua antiguidade, aos arquitectos das catedrais góticas, aos mestres do Renascimento como Miguel Ângelo, Leonardo da Vinci e Raphael, todos reconheciam na natureza formas e proporções especiais, que traduziam uma harmonia e unidade em si e que usavam nas suas obras para que estas irradiassem essa beleza, numa alegoria da obra a Deus.

O “Homem de Vitrúvio”, desenho de Leonardo da Vinci, apresenta-nos um homem desnudado inscrito dentro de um quadrado e de um círculo. Numa breve análise em busca de descodificar o seu pensamento, observamos a simbologia e retiramos uma mensagem do génio através da soma destas três figuras: o círculo, símbolo do Sol, da vida e de todo o infinito; o quadrado, símbolo do mundo terreno, ordem e equilíbrio; e o homem desnudado como que recém-nascido, nas suas duas posições que assentam, uma no quadrado e outra no círculo (terrena e celeste), transmitindo a ideia de um mundo e universo que se ligam e que estão feitos à medida do homem, sendo ele a medida para o todo.

Este desenho, pelos elementos subliminares e simbólicos, e pelo traço do mestre, não deixam o observador indiferente, exaltando fascínio e mistério quando se contempla.

Na complexidade e diversidade da ciência da geometria, encontramos um número, uma “fórmula” a que se atribuiu pelo seu fascínio, o nome de Geometria Divina, também conhecida por proporção de ouro ou Phi que se traduz na relação entre dois segmentos. Vejamos a FIGURA 1 aqui representada: se dividirmos a altura de uma pessoa pela medida do seu umbigo até ao chão, obtemos essa relação.

Esta proporção é conhecida também por secção áurea, a divina proporção, proporção áurea, e que fez o homem interrogar-se quando a descobriu: Quem é o grande arquitecto do Universo? Quem comanda a vida?.

Essas relações de forma e proporções consideradas sagradas na geometria encontram-se na natureza, do microcosmo ao macrocosmo.

Johannes Kepler (séc. XVII), matemático, astrónomo e astrólogo alemão, no seu estudo do movimento elíptico dos planetas em volta do Sol, esse “relógio” suíço suspenso no nada, fez menção à proporção divina.

O Phi está também presente na música de grandes compositores como Mozart, Beethoven, e Bach. Stradivarius, por exemplo, usava-a para o desenho e construção dos seus violinos.

Famosas construções como o Partenon, a Grande Pirâmide de Giza, Stonehenge e a Catedral de Chartres, todas integram a divina proporção.

O mistério da vida, esse, irá perdurar entre as barreiras da fé e da ciência, e por vezes na comunhão entre as duas. Quanto ao homem, continuará na senda da sua pedra filosofal, o alquimista em busca de tocar o criador.

Jesus deixou-nos o meio de nos chegarmos a Deus: «Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai senão por Mim» (João 14:6).

«Pedi, e ser-vos-á dado; procurai, e encontrareis; batei, e hão-de abrir-vos. Pois, quem pede, recebe; e quem procura, encontra; e ao que bate, hão-de abrir» (Mt 7:7, 8).

Jesus, conhecedor do coração dos homens e das suas fraquezas, deixou-nos através das escrituras o caminho para fortalecermos a nossa fé, desvanecermos as nossas dúvidas, e ensinou-nos a ter uma relação com o Pai, alertando-nos para a fragilidade da fé de cada um: «Disse-lhes Ele: “Pela vossa pouca fé. Em verdade vos digo: Se tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a este monte: ‘Muda-te daqui para acol’, e ele há-de mudar-se; e nada vos será impossível”» (Mateus 17:20).

Muitos são os que procuram, esquecendo que Deus é omnipresente e fôlego da vida que está em nós. Precisamos de ter fé e lembrarmo-nos que viemos d’Ele, como nos ensinam as escrituras: «Então o SENHOR Deus formou o homem do pó da terra e insuflou-lhe pelas narinas o sopro da vida, e o homem transformou-se num ser vivo» (Gn 2:7).

Miguel Augusto

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