«Querido Papa, escrevo-te…», e eles lêem.
Padres, religiosas e também mães. Abrem a correspondência, distribuem-na e respondem às cartas, uma a uma. Porque ele assim quis: «Deve fazer-se assim com todos, não é?».
Os sacos chegam logo de manhãzinha, ao terceiro andar do Palácio Apostólico, um departamento da Secretaria de Estado. Ali há uma porta e uma escada que desce para o andar logo abaixo, que está em posição intermédia. No passado, eram salas onde se podiam fazer boas sonecas estas onde agora se abre o correio dirigido ao Papa. Assim eram até à eleição de Jorge Mario Bergoglio, até ao momento em que o mundo inteiro descobriu a empatia extraordinária do Papa Francisco, ou seja, a sua capacidade de compreender o estado de alma dos outros, quer seja de alegria ou de sofrimento, de se identificar com ele, como se o Papa sentisse dentro de si as emoções de cada pessoa.
Foi assim que o Departamento Postal do Papa Francisco se viu ocupado de uma forma nunca vista. Primeiro foi alargado para o dobro e depois cresceu ainda mais, até que agora as cartas que chegam são até quinze vezes mais do que no passado.
Ao Papa todos escrevem. Mas não é só para pedir; em muitos casos, escrevem para aconselhar como deveria guiar a barca de São Pedro. E ele quer que se responda a todos. Mas despachar um milhar de cartas semanais, em todas as línguas, ainda que o Espanhol tenha o primeiro lugar e o Italiano o segundo, quase sempre escritas à mão com evidentes dificuldades de leitura, por pessoas muito diversificadas, desde criancinhas a avós, de mães grávidas a presos de todas as cadeias do mundo, é uma tarefa árdua e complexa, além de delicadíssima.
No entanto, estas salas são o “front office” da Igreja de Francisco, “o departamento mais avançado”, o mais importante para ele entre todos os outros da Cúria Romana. Foi ele quem fez esta revolução quando um dia, depois de ter sido eleito, um dos dirigentes do departamento de correspondência viu abrir-se uma porta e notou uma mão e uma manga branca que se aproximavam. A renovação passou pela adaptação sintática. Não mais Sumo Pontífice, mas Papa Francisco: chega de terminologia barroca e altissonante sobre o Santo Padre que agradece e abençoa.
Bergoglio tornou-se amigo das esferográficas. Pela manhã abrem-se as cartas divididas por línguas, depois por temas e a seguir por categoria dos que lhe escrevem. As crianças são as mais numerosas e enviam desenhos, colagens, bonecos de tela. Há no Departamento Postal uma equipa de mães para tratar destas cartas, há irmãs e sacerdotes, voluntariamente ao serviço da esferográfica do Papa, porque ele sozinho não o pode fazer.
Há uma equipa para conversar acerca das cartas mais difíceis, sobre os conselhos que um Papa deve dar, sobre as pessoas a avisar nas várias dioceses e nas paróquias das quais vêm, porque Bergoglio assim quer.
Um dia, o Papa entrou no Departamento Postal para se assegurar: «Responde-se a todos, tem de ser assim». E todas as semanas há ainda algumas cartas que acabam por chegar à escrivaninha do Papa em Santa Marta. São as mais íntimas, aquelas a que o Pontífice responde pessoalmente. Às vezes, decide telefonar a quem lhe escreve, ou então manda-as para trás com indicações precisas. O povo escreve ao Papa porque tem confiança nele, e também porque desconfia dos outros. Cada um narra o seu drama de indigência, de desemprego, de contas para pagar, de filhos a crescer. Do Vaticano saem contactos para as paróquias e para a Cáritas, e o povo compreende a importância da empatia que o Papa tem. Escrevem-lhe porque parece simpático e pela resposta compreende-se bem que tem algo a ver com a vida de cada um.
As cartas das crianças são uma mina de afectos. Alessandra Buzzetti, jornalista do canal 5, reuniu algumas no livro Letterine a Papa Francesco (Cartinhas ao Papa Francisco, numa tradução literal). Faltam as respostas, mas o padre Antonio Spadaro, director da Civiltà Cattolica, irá solucionar esta situação quando na Primavera for publicado nos Estados Unidos um livro que contém as respostas autografas do Papa aos seus amigos da esferográfica. Passar uma manhã nas salas do “front office” de Bergoglio é como debruçar-se sobre a vida íntima que se confia a um papel, a um lápis, a selos, instrumentos que passaram de moda, praticamente ultrapassados.
As crianças são inacreditáveis. Convidam-no para lanchar com pão e Nutela, para ir ter com elas à paróquia, a visitá-las em sua casa: “Poderás dormir na casa do pároco se quiseres; caso contrário, tenho um quarto a mais cá em casa”.
No livro, a mais bela carta é de uma menina que conta acerca dos encontros de Catecismo: “Muitas vezes vamos aqui à Missa e neste caso tu serias um sacerdote perfeito”. Nelas há sofrimentos que nos comovem até às lágrimas e alegrias que só nos fazem rir as gargalhadas. Uma criança dá-lhe o conselho para se vestir como São Francisco e, para ser mais claro, envia-lhe um boneco com o saiote e a cruz de madeira. Nada se perde, mas tudo se conserva, até mesmo os bilhetes que as pessoas lançam para dentro do papamóvel. Se ali houver uma morada escrita, receberá resposta.
ALBERTO BOBBIO
In Famiglia Cristiana