Que Boa Nova a esta geração e à que vem aí?

COMUNICAÇÃO COM RESPONSABILIDADE PARA O BEM DA SOCIEDADE

Que Boa Nova a esta geração e à que vem aí?

Que Boa Nova anunciar a esta geração e à que vem aí, encharcadas que andam na super-informação dos mil e um ruídos informativos que as invade e dos amontoados de antenas, telemóveis, redes de Internet, “twitters”, “facebooks”, “Ipads”…? Que novidade e que forma de a comunicar na complicada teia informativa que tudo nivela e quase sempre releva o falso e o fútil? Ficam breves linhas de alerta e de tentativa de conversão a novas linguagens e formas de comunicar a Boa Nova de Jesus Cristo, em competência e verdade.

“As pessoas só podem existir em relações definidas com outras pessoas” (Mead, George H).Lembremos os Magos que foram até Belém, guiados por uma estrela. Na caminhada houve momentos em que o sinal luminoso (electrónico?) falhou. Então os Magos perderam o rumo e a estrela, experimentando a realidade da incomunicação; embora acidental, provisória e mesmo pedagógica, os Magos experimentaram a realidade da incomunicação a dois níveis: a nível de signo/sinal (a estrela desaparecera) e a nível de significado e referente (o Menino para os Magos era Rei que vinham adorar, para Herodes um inimigo a abater). Não se tratou de uma incomunicação fruto de uma informação manipulada ou estruturalmente intencional na origem, mas de uma incomunicação consequência das naturais fragilidades do sinal e das pessoas envolvidas; este condicionalismo que não as impediu, contudo, de uma pesquisa cuidadosa sobre o lugar “onde estava o Menino”.

Hoje, a realidade da incomunicação vem logo nas raízes mesmas da informação estruturada e híper-subjectividade, em função da construção de uma realidade ideológica, política ou de marketing. Daqui, o surgimento do fenómeno “bloqueio comunicativo” intrapessoal, em que a pessoa se fecha a si mesma e aos outros, apesar da super-informação dos mil e um ruídos informativos que a invade e dos amontoados de antenas, telemóveis, redes de Internet ou CD. É o fenómeno preocupante, chamado “vazio da solidão”, onde a pessoa se corrói e se definha, se marginaliza e desespera, tornando-se incapaz de prosseguir o Sinai da própria dignidade afogada no ruído, e perdida sobre o rumo do “Menino”.

A MULTIDÃO DAS SOLIDÕES

O cardeal D. Martini, arcebispo de Milão, falava de «a multidão das solidões» para significar a multidão das incomunicabilidades humanas, mesmo lá onde parece haver uma normal comunicação: as incomunicabilidades dentro de cada um, nas famílias, na sociedade, na Igreja, na comunicação de massa.

Dois terços da humanidade não têm acesso nem possibilidades de acesso aos modernos meios de comunicação; noventa por cento não tem participação, nem directa nem indirecta, na programação, produção e gerência das mensagens comunicativas. Com este paradoxo: «nunca antes o nosso planeta contou com tão poderosos meios de comunicação e nunca os homens foram advertidos, com tanta frequência e ênfase, sobre a sua impotência comunicativa…». Cada vez mais, o Homem se sente “perdido” entre as florestas das antenas e o ruído dos sons. Em muitos casos da solidão interior, é a própria comunicação exterior que a provoca e acentua. Frente ao televisor, facilmente as pessoas se transformam em móveis da casa; perderam o dom da comunicabilidade em troca (por vezes forçada ou tacticamente tolerada) da sujeição ao programa. E com tanta “comunicação” de fora, a incomunicabilidade intrapessoal e intergrupal vai abrindo profundos fossos.

A NOTÍCIA MANIPULADA, QUE PODE TAMBÉM ACONTECER AO EVANGELHO

O fenómeno da incomunicação alarga-se ao âmbito da própria “notícia” que é truncada ou degenerada logo na sua construção originária segundo parâmetros ideológicos, políticos, comerciais. Aquilo que se chama “informação e comunicação manipuladas” vai ganhando foros de autenticidade, criando públicos e opinião desinformados e, por isso, manipulados e manipuláveis.

William Rivers e Wilbur Schramm falam da “responsabilidade na comunicação de massa” como um conceito novo de “comunicação” em relação ao do autoritarismo, liberalismo ou a teoria comunista da antiga União Soviética. O núcleo central desta teoria da responsabilidade é, no fundo, a recusa do jornalista e de todo o comunicador às cedências da manipulação e da corrupção para cumprir fielmente a sua missão de comunicar. Se, por mais esforço que o jornalista faça para ser neutro e objectivo, a notícia aparece, quase sempre, com um inevitável peso subjectivo, mais ela se afastará da objectividade (que terá de ser a meta) se quem a faz e veicula não se opuser às coacções e “matrizes” impostas pelos grupos de interesses ou de poder. Na comunicação eclesial e missionária, mais se impõe a conversão que leva o comunicador a recusar a “notícia de si”.

Por outro lado, se o receptor não souber descodificar a comunicação, de modo a perceber até que ponto ela é informação, ou pura opinião, ou intenção de grupos de poder, a mensagem que recebe fica, deste modo e uma vez mais, agravada na realidade da incomunicação.

Nas raízes da incomunicabilidade estão sempre os vermes do querer possuir o outro, dominar, explorar, identificar-se com o emissor. Pregar o Evangelho para agradar aos ouvintes é caricatura. Estas caricaturas da verdadeira comunicação desfar-se-ão à medida que o Homem se for abrindo ao “evangelho da comunicação”, à boa nova de uma comunicação árdua, mas possível – a comunicação que nos foi oferecida por Deus vivo no próprio acto de se comunicar a nós.

A COMUNICAÇÃO É CONDIÇÃO DE EXISTÊNCIA HUMANA

A comunicação é condição de existência humana. Em perspectiva cristã, a comunicação é a plena comunhão do Homem com Deus, com os outros e com a natureza. Estes três planos inseparáveis e hierarquizados entre si correspondem às três grandes dimensões em que se desdobram a existência e a cultura humanas. A vocação de o Homem ser filho de Deus em Cristo é a última e radical dimensão, que constitui o núcleo mais profundo do anúncio da Boa Nova. Esta filiação divina é também fundamento e raiz das “relações definidas com os outros” (Mead). “0 homem moderno não tem conseguido construir uma fraternidade universal, porque procura uma fraternidade descentrada e sem origem comum. Esqueceu que os homens só têm uma maneira de se tornarem irmãos: reconhecer que procedem do mesmo Pai”. Só quem enfrenta a história segundo o anúncio e a práxis filial de Jesus como “ser-para-os-demais” é capaz d e converter-se também em senhor dela e de construir um mundo de comunhão fraterna.

A consciência e a vivência desta dignidade de filhos de Deus e irmãos uns dos outros, em Cristo, faz-nos sentir o chamamento à participação no agir histórico, na construção de um projecto comum de felicidade. Esta vocação não se cumpre apenas através do diálogo interpessoal e intimista, mas também através das relações de trabalho solidário e da cooperação social de todos. Deus não exclui ninguém deste projecto. E ninguém tem o direito de excluir ou de ser excluído por outros. Participar é comunicar-se, e comunicar-se é participar.

A Boa Nova do anúncio cristão visa esta participação plena na comunicação, sem “gatekeepers” de controlo da verdade total ou “tematizações” que gerem a marginalização. Em teologia moral, chama-se “pecado” a toda a ruptura de comunhão e de comunicação. A Boa Nova de Jesus Cristo, porque O comunica Vivo, Verdade, Caminho, é o sinal autêntico desta ruptura. O “Logos” de Deus opõe-se a todas as perversões da comunicação e a tudo quanto impede a comunicação de permanecer na Verdade.

O cume da incomunicação é a violência assassina. Quem não ama leva em si o gérmen da morte. Não basta ignorar e marginalizar o outro; busca-se primeiro amordaçá-lo ou destruir-lhe a consciência para que não veja nem proclame a verdade que molesta e acusa.

A perversão da comunicação é capaz também de produzir um remédio pecaminoso de “comunhão negativa”: a união das forças negativas que formam sólidas e disciplinadas organizações ao serviço do dinheiro ilícito, do crime organizado ou da opressão política. É o chamado “pecado institucional ou das estruturas”.

A Boa Nova de Jesus Cristo contradiz essa dinâmica e anuncia que Deus permanece fiel ao seu desígnio de salvação total do Homem, continuando a irromper na história humana para libertar o Homem da incomunicação e de todas as servidões, restabelecendo-o em comunhão. A Boa Nova de Cristo é (e tem de ser dita) como a explosão da verdade.

A BOA NOVA, UMA EXPLOSÃO DA VERDADE

“Vimos a estrela… e viemos… Ouvido o rei, puseram-se a caminho e eis que a estrela, que tinham visto no Oriente, ia adiante deles, até que chegou ao lugar aonde estava o Menino e parou”.

Um sinal eficaz, porque verdadeiro, esse da estrela que conduziu os Magos a Jesus Menino. Paradigma daquela comunicação que garante ao Homem encontrar-se, encontrando os outros. Os meios não são a verdade; apenas a apontam e dela devem ser garantes. Como na caminhada dos Magos, ou a estrela da comunicação garante ao Homem a Verdade donde nasce ele, por onde vai e aonde chega, ou a comunicação cai na face oculta da sua própria miragem, dizendo sem nada dizer, emitindo sem nada comunicar.

Por definição semântica, comunicação implica “pôr em comum”, partilhar e trocar mensagens, incluindo todos os procedimentos por meio dos quais uma mente pode afectar outra mente, envolvendo tanto a linguagem escrita e oral como todas as manifestações de comportamento social e cultural. A comunicação será, pois, autêntica na medida em que “partilha e transmite” a realidade intrapessoal e social sem manipulação da verdade. Só uma comunicação que partilha a vida e o real interessa ao crescimento interior da pessoa, lá onde se jogam a identidade e a relação com os outros, na confiança e na responsabilidade.

Os teóricos da comunicação, hoje, discutem se é ou não possível adjectivar qualitativamente a notícia, para além dos meios, estes adjectiváveis. Por outras palavras, intenta-se assegurar se a notícia que se recebe, pela comunicação, é “natural” ou “artificial”, uma boa ou má notícia, uma verdadeira ou falsa notícia. Num mundo, onde a notícia é negócio, concorrência, audiência, interesse e publicidade, é lícito colocar-se, com acuidade, a questão da notícia em critérios de verdade, objectividade e imparcialidade.

Como explosão de verdade, a notícia (que, em Português, evoca, justamente, a ideia de “coisa anotada”) impõe-se ao comunicador, ao jornalista, ao missionário. A notícia para ser boa tem de ser autêntica. Não é criação de quem a veicula. Surge independentemente da sua vontade; tem existência positiva, isto é, pode ser comprovada por oposição aos juízos normativos incontroláveis. A matriz referencial da sua autenticidade é, igualmente, a sua positividade existencial e não a mera “factualidade fantástica”, imaginária ou virtual.

A BOA NOVA DE JESUS EXIGE COMPETÊNCIA E VERDADE

Toda a comunicação, porque verdade e ao serviço da pessoa e da sociedade, são reais e não virtuais. É a verdade que salva a comunicação e dá credibilidade às instituições. O problema põe-se não tanto na definição teórica da verdade, que não é fácil de definir e não recebeu resposta de Cristo à pergunta de Pilatos, embora Aristóteles, muito antes, na sua Retórica, dissera poder usar este critério para avaliar da verdade ou falsidade de uma declaração: “Dizer que o que é não é, ou o que não é, é, é falso; ao passo que dizer o que é, é, e o que não é, não é, é verdadeiro”, mas o problema põe-se, sobretudo, na sua transmissão, minorando, ao máximo, com competência e honestidade, a inevitável subjectividade inerente.

Se a verdade é o que torna úteis as nossas convicções, também é ela que dá sentido à comunicação.

Ao cristão, ao missionário são-lhes exigidas a convicção, competência e a verdade.

Como os Magos “utilizaram”, sabiamente, o sinal indicador da Verdade e deram de frente com Ela, assim, toda a comunicação deve levar o Homem à explosão da Verdade através dos sinais comunicativos que o conduzam à leitura correcta dos factos e da sua ambiência, em decisivo fulgor da verdade de si mesmo e da história. Só Deus converte, mas a verdade e a humildade do seu comunicador levam a Ele.

Pe. Artur de Matos 

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