Um descendente de Xangai
A conhecida família Leitão, de Macau, tem várias ramificações, um pouco à semelhança de todas as famílias macaenses. Ao longo dos séculos, os casamentos entre famílias foi contribuindo para que a miscigenação fosse complexa e extensa, dando origem a uma vasta rede de relações.
Alguns – muitos, digamos – ainda persistem pelo território, mas outros há espalhados pelos quatro cantos do mundo. Uns nascidos em Macau, outros em Xangai, onde parte da família viveu e fez pela vida durante séculos, até ao êxodo forçado pela Revolução Cultural.
É dessa parte da família, do ramo de Xangai, que irei falar. Recentemente, tive conhecimento de uma pessoa que fora casada com um distinto membro da família Leitão. Infelizmente esta foi apenas uma conversa introdutória com um dos seus netos, Pedro Leitão, que por acaso é nosso colega nas andanças da comida de rua. É especialista em cozinha mexicana, pois viveu muitos anos no México, tendo explorado um restaurante de comida portuguesa. A arte dos tacos e afins aprendeu com os seus cozinheiros mexicanos.
Palavra puxa palavra, sendo ele também um apaixonado pelos barcos – o pai teve um veleiro durante muitos anos – acabámos por falar sobre Macau, vindo de imediato a avó à conversa.
A senhora dona Natércia, que irei entrevistar quando surgir a oportunidade, nasceu em Xangai no ano de 1923. Casou com Manuel Leitão, filho de Fernando Leitão, “genti di Macau”. Viveu toda a vida em Xangai, até os comunistas chineses chegarem ao poder e ter sido evacuada por barco para a Europa.
Segundo nos contou o neto, a avó e os restantes familiares foram os últimos Leitão a deixar a China, depois de Mao Tse Tung ter chegado ao poder e o Partido Comunista Chinês passar a deter o monopólio do sistema político do País.
O navio que os trouxe juntamente com outras centenas de pessoas foi a última oportunidade que os estrangeiros residentes em Xangai tiveram de deixar a China em segurança.
Da parte da família de Manuel Leitão – segundo recorda este seu neto – eram onze irmãos, mas nenhum ficou em Macau. Estão espalhados um pouco por todo o lado – Brasil, Canadá, Estados Unidos, Austrália e Europa.
No que respeita à avó, recorda as experiências culinárias, com o minchi à cabeça, e os relatos que ouvia sobre a Xangai internacional dos anos 30 e 40 – histórias das vivências da família em território chinês e de como a cultura chinesa influenciou a educação transmitida à sua mãe, filha de Natércia.
Não me quis adiantar mais detalhes porque quer que seja eu a descobri-los. É que apesar da idade está lúcida e adora conversar sem nunca perder o fio à meada. Espero que a entrevista se realize o mais breve possível para vos dar o relato na primeira pessoa. Para além da história de vida, quero também ficar a saber um pouco mais da aventura deste ramo da família Leitão. Ao que parece, há documentos a comprovar a posse de um terreno em Macau. Até ao momento, a família nada fez para reaver o mesmo.
Conhecemos o Pedro desde o evento de Quiaios, mas só recentemente tivemos a oportunidade de aprofundar a conversa e assim ficarmos a saber um pouco mais da experiência de vida de cada um. O que nos ligou (o famoso elo de ligação – pleonasmo – muito querido em Macau) foi o gosto pelos barcos. A partir daí a conversa foi desfiando sempre que o Pedro vinha comer ao nosso food truck. É apaixonado por comida tailandesa, sendo que também não nos fazemos rogamos com boa comida mexicana. Andamos sempre à espera de o encontrar nos eventos em que participamos.
Entretanto, na nossa romaria por Portugal – saltitando de lugar em lugar, levando a nossa comida tailandesa de Norte ao Sul do País – iremos à terra natal do ex-Presidente da República, Cavaco Silva. Boliqueime irá realizar, pela primeira vez, um festival de street food e tiveram a amabilidade de nos convidar. Tem lugar na terceira semana de Agosto. Antes estaremos em Santarém e Oeiras.
Depois de Boliqueime iremos à Praia das Maçãs para as Festas da Nossa Senhora do Mar. Pela primeira vez, a organização reservou uma zona exclusiva de street food. Fomos convidados a sugestão de um colega de profissão que vende kurtos kalacs (uma sobremesa tradicional da Transilvânia). Decidimos aceitar porque na vila mora uma grande amiga que passou grande parte da sua vida em Macau. Aliás, as duas filhas mais novas nasceram no território.
Depois do evento na região de Colares, na última segunda-feira de Agosto, rumaremos novamente ao Algarve, desta vez a Almancil, onde iremos servir na festa de pré-casamento de uns jovens canadianos, de ascendência indiana e cingalesa e cujas famílias têm residência de férias no Sul de Portugal. Daí terem escolhido o nosso país para oficializarem a união matrimonial. Será uma viagem de apenas um dia para servir cerca de cem pessoas.
Depois entraremos em Setembro, o último mês de actividade este ano. Segue-se a preparação da viagem para Curaçao, onde iremos voltar a viver a bordo do Dee.
João Santos Gomes