A missão que faz a Igreja na sua Igreja local
O cardeal D. Luis Antonio Tagle recordou aos directores nacionais das Pontifícias Obras Missionárias (POM), reunidos em Roma para a sua Assembleia Geral anual, que a experiência testemunhada pelos primeiros discípulos de Jesus, durante a Igreja primitiva, continua a ser o ponto de referência para toda a obra missionária.
O encontro entre o cardeal Tagle e os directores nacionais das POM decorreu no Colégio Internacional São Lourenço de Brindisi. No discurso que proferiu – como noticia Gianni Valente, repórter da agência noticiosa FIDES – o prelado filipino começou por “definir a tarefa e as responsabilidades confiadas aos seus interlocutores na audiência”. Lembrou que cada director nacional das POM pode ser visto como “o sinal, o símbolo e o instrumento da identidade missionária da Igreja, segundo os ensinamentos do Concílio Vaticano II”. É por isso que o director da Missão é chamado a ser “o rosto, a voz, as mãos, os pés e o coração de uma Igreja que faz missão e a missão que faz a Igreja na sua Igreja local”.
Desde a sua origem – acentuou D. Tagle – as Pontifícias Obras Missionárias “têm sido expressões da fidelidade dos fiéis católicos a Cristo, transformada em corresponsabilidade missionária, isto é, em discipulado missionário”. No entanto, o zelo apostólico nunca é um impulso auto-gerado nem o resultado da aplicação mecânica de um “método missionário”.
Nos relatos dos primórdios da missionação que os padres de antanho nos legaram revelam-se já a natureza inerente e os traços genéticos da obra missionária: a universal mensagem evangélica de libertação, o cuidado para com os pobres e a solicitude pela cooperação e partilha de bens, dons, carismas e ministérios. O cardeal ilustrou estes aspectos através de exemplos sugestivos. Recordou, por exemplo, o seguinte episódio do tempo de Cristo: face às disputas que surgiram na Terra Santa sobre a exigência de circuncisão para os não judeus que se convertiam ao Cristianismo, Paulo e Barnabé foram a Jerusalém e “convocaram uma assembleia com os apóstolos e os anciãos”. Este tornou-se assim o primeiro Concílio, o Concílio de Jerusalém. A “conversa imbuída pelo Espírito Santo” envolveu os apóstolos e os anciãos, que ali ouviam a Palavra de Deus e presenciavam os seus actos. Tomava forma, já então, uma “organização” de alcance universal, mas de natureza profundamente espiritual.
Destes primeiros passos da Igreja nascente destaca-se a importância da oração, a escuta da Palavra de Deus, o discernimento e o respeito mútuo como traços distintivos que caracterizam toda a forma de cooperação missionária universal organizada. Esta – sublinhou o cardeal Tagle – é “a ‘alma’ da ‘organização’”.
O apóstolo Paulo – lembraria ainda D. Tagle, a respeito das primeiras comunidades cristãs – iniciou também uma campanha de angariação de fundos entre as novas Igrejas gentílicas da Macedónia e da Achaia para apoiar a Igreja pobre de Jerusalém. O designado “Apóstolo dos gentios” elogiou até as Igrejas da Macedónia por partilharem o que podiam, apesar da sua pobreza, testemunhando a “circulação do amor” entre as Igrejas jovens e mais antigas, “filosofia” inerente às actividades das POM. “Quem semeia pouco”, como afirma a Segunda Carta de São Paulo aos Coríntios, “também colherá pouco, e quem semeia com abundância também colherá abundantemente (…) porque Deus ama quem dá com alegria”.
A oração em comum, a partilha da Eucaristia e também dos bens materiais acompanhavam a vida das primevas comunidades cristãs. Os membros dessa irmandade vendiam os seus bens e depositavam o dinheiro aos pés dos apóstolos, que os distribuíam de acordo com as necessidades de cada um. A este propósito, o cardeal Tagle recordou a história de Ananias e Safira, narrada nos Actos dos Apóstolos. Esses pioneiros cristãos venderam um pedaço de terra, mas guardaram parte do dinheiro para si. Pedro repreendeu-os, dizendo: “Não mentiram aos homens, mas a Deus”. Depois disso, Ananias e Safira morreram. Na Igreja de Cristo, observou o prelado filipino, tais acontecimentos ocorreram “mesmo logo após a Ressurreição e o Pentecostes”. No entanto, os traços essenciais que acompanharam e caracterizaram o primeiro trabalho apostólico foram os da oração, do respeito mútuo, da escuta e da partilha. Todos estes são elementos que hoje caracterizam e tornam reconhecível toda a cooperação missionária autêntica.
D. António Tagle reiterou que também as Pontifícias Obras Missionárias se alimentam “desta primeira experiência pascal”. O trabalho dos directores nacionais das POM pode também ser visto e vivido como uma extensão do trabalho dos primeiros Apóstolos. “Nós também”, concluiu, “podemos incentivar a missão e a nossa organização aprendendo com aqueles que encontraram o Senhor Ressuscitado e foram enviados por Ele na força do Espírito Santo”.
Joaquim Magalhães de Castro