A Diáspora Chinesa em Portugal – 2

Um povo em movimento

A estrutura empresarial do imigrante chinês tem a sua origem em indivíduos «com níveis de instrução baixos, que criam as suas próprias empresas alicerçadas numa rede de relações familiares e étnicas, facilitadoras da sua integração económica». O sistema utilizado é o seguinte. Começa por emigrar o pai. Uma vez estabelecido manda vir a mulher e só depois os filhos, se possível já numa idade pós instrução primária, já que é importante que eles tenham uma formação base que lhes permita solidificar a sua identidade, junto dos avôs, na terra natal. Assim se cria, desde o início, uma estrutura de negócio, alicerçada sobretudo na restauração e na importação de produtos asiáticos, de base familiar. Uma vez solidificada essa estrutura contratam-se elementos exteriores, «raramente recorrem a mão-de-obra não chinesa». Estes, por sua vez, logo que se encontrem em situação financeira estável, formam eles próprios novos núcleos familiares que contratarão «trabalhadores co-étnicos», e por aí em diante. Alfredo Gomes Dias não concorda que a comunidade chinesa seja assim tão fechada sobre si própria como se diz, pois «não encontramos chineses somente nos restaurantes e lojas, mas também nos jardins, nas ruas e nas escolas». As famílias enviam os filhos às escolas portuguesas, onde eles, aliás, atingem resultados académicos muito satisfatórios. «Os chineses esforçam-se imenso para aprender Português, não só os jovens mas também os adultos», diz. O problema reside, na opinião do historiador, no Ministério de Educação que «não está a dar resposta adequada às crianças estrangeiras que recebe».

A falta de visibilidade da comunidade chinesa deve-se precisamente à sua autonomia, daí que as ONG não estejam a lidar directamente com ela, como acontece com as comunidades eslava e africana.

E porque continuam a chegar chineses a Portugal? Essencialmente, no entender de Gomes Dias, porque não estão ainda saturados os mercados de trabalho, ao contrário do que acontece nos outros países europeus. Depois, os progenitores tudo fazem para reunir a família. Finalmente, há que ter em conta o aproveitamento dos períodos de regularização extraordinária, (em 1992, 1996 e 2001), que permitiram que muitos emigrantes em situação irregular passassem a estar legais.

Existe uma diferença substancial que distingue os chineses dos emigrantes dos países de leste. Enquanto estes vêm para Portugal com a intenção de um dia regressar ao seu país de origem, os chineses estabelecem-se em Portugal para deixar raízes, sem nunca, porém, desviarem-se um milímetro que seja das suas próprias.

No final do século XX, o número de emigrantes chineses, de diferentes gerações, espalhados pelo mundo era de cerca de vinte milhões. Resultado de vagas sucessivas que remontam ao período da primeira Guerra do Ópio (1840) e daí até ao estabelecimento da República Popular da China em 1949. O poderio político e económico das potências ocidentais exigia então abundante mão-de-obra, fosse nos estabelecimentos britânicos do Sudeste Asiático ou na construção de caminho de ferro nas Américas, aos quais estava associado o tráfico de cúlis (de 1844 a meados de 1870) ao qual Macau esteve profundamente ligado. Com a solidificação dos comunistas no poder, a emigração reduzir-se-ia drasticamente, tendo vindo a inverter-se a tendência em 1978, com as reformas económicas “denguexiaopinistas”. Sobre esta matéria escreve Alfredo Gomes Dias: “Nos anos 80, o Governo chinês acompanha a sua abertura económica com a flexibilização das suas políticas de emigração. Com a entrada da China na Organização Mundial do Comércio (WTO) em 2001, as autoridades chinesas passam a ter um interesse redobrado na diáspora chinesa fortalecendo as ligações entre a ‘Mãe China’ e as associações das comunidades chinesas espalhadas pelo mundo”.

Nos anos de 1989-90 assiste-se na China a um elevado nível de emigração, com especial incidência nas zonas costeiras de Xangai, Pequim, Fujian, Guangdong e Jiangsu, “algumas dessas regiões que vivem actualmente a influência das experiências de modernização económica”. América do Norte, Austrália, Sudeste Asiático e Europa são os destinos predilectos dos emigrantes, havendo, porém, nos últimos anos, fluxos com destino a países do centro e sul da América, nomeadamente o Belize, o Panamá, a Bolívia e o Brasil.

Quanto às motivações para a partida, incidem, sobretudo, “nos fenómenos de mobilidade económica para países mais ricos, tecnicamente mais avançados e politicamente estáveis, e na frequência de escolas e universidades”. Existem ainda factores políticos e económicos, de ordem interna, que podem contribuir para a explicação da emigração chinesa, “a prosperidade económica que a China tem conhecido nos últimos anos concentra-se nas regiões costeiras, contrastando com a pobreza no interior – este fenómeno explica as migrações internas; o crescimento da população e as elevadas taxas de desemprego estimulam o aumento da emigração”.

De notar ainda os diferentes níveis sócio-culturais do emigrante chinês. Os de Pequim e Xangai são emigrantes com elevados níveis de educação enquanto que os emigrantes de Fujian, Guangdong e Zhejian são maioritariamente camponeses e operários fabris.

Joaquim Magalhães de Castro

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