14º DOMINGO COMUM – Ano A – 9 de Julho

14º DOMINGO COMUM – Ano A – 9 de Julho

Descansando em Cristo

«Vinde a mim todos os que estais cansados de carregar suas pesadas cargas, e Eu vos darei descanso» (Mt., 11, 28).

As férias de Verão estão a começar, mas muitas pessoas, eu inclusivamente, estão a viver um grande paradoxo. Por um lado, estamos muito cansados devido ao nosso estilo de vida, stressante e cheio de compromissos. Por outro lado, não sabemos aproveitar bem o nosso tempo livre. Ou o desperdiçamos absorvidos pelos nossos “smartphones”, ou tentamos fugir dos nossos problemas com actividades emocionantes ou indulgentes, apenas para depois virmos a descobrir que voltámos à estaca zero, quando voltamos… O “escapismo” tem uma eficácia muito limitada no que respeita à recuperação e restauração da nossa mente e corpo cansados.

Ninguém pode negar a importância de fazermos uma pausa regular: passar algum tempo a realizar actividade física, possivelmente em contacto com a natureza; desfrutar de convívios com amigos e de boa comida, para exalar as preocupações e a ansiedade. Estas são actividades indispensáveis para a nossa saúde física e psicológica.

Mas o conceito de “descanso”, profundamente enraizado na Bíblia, também tem conotações espirituais que precisam ser consideradas. Deus descansou ao Sétimo Dia, após a criação do Universo, simbolizando o facto de que a Criação foi um acto de livre arbítrio: um presente e não um trabalho “obrigatório”. Até os Dez Mandamentos exigiam que se descansasse ao sábado.

Tendo sido escravo no Egipto, o povo de Israel compreendeu dolorosamente a importância do descanso: estar permanentemente e forçosamente a trabalhar é uma crueldade que ninguém deveria experimentar!

Como consequência, o conceito bíblico de descanso, longe de ser simplesmente “férias”, tornou-se interligado com a defesa da dignidade e da sacralidade da vida humana. Estes valores foram consequentemente absorvidos na celebração do Dia do Senhor, o sábado cristão, dia em que celebramos a Ressurreição de Cristo.

Na secção dedicada ao Terceiro Mandamento (a santidade do sábado), o Catecismo da Igreja Católica ensina que “o agir de Deus é o modelo do agir humano. Se Deus «descansou» no sétimo dia (Ex., 31, 17), o homem deve também ‘descansar’ e deixai que os outros, sobretudo os pobres, ‘tomem fôlego’. O sábado faz cessar os trabalhos quotidianos e concede uma folga. É um dia de protesto contra as servidões do trabalho e o culto do dinheiro” (CIC nº 2172). Mais adiante, afirma: “A vida humana é ritmada pelo trabalho e pelo repouso. A instituição do Dia do Senhor contribui para que todos gozem do tempo de descanso e lazer suficiente, que lhes permita cultivar a vida familiar, cultural, social e religiosa” (CIC nº 2184). E ainda: “Os cristãos que dispõem de tempos livres lembrem-se dos seus irmãos que têm as mesmas necessidades e os mesmos direitos, e não podem descansar por motivos de pobreza e de miséria. O domingo é tradicionalmente consagrado, pela piedade cristã, às boas obras e aos serviços humildes dos doentes, enfermos e pessoas de idade. Os cristãos também santificarão o domingo prestando à sua família e vizinhos tempo e cuidados difíceis de prestar nos outros dias da semana. O domingo é um tempo de reflexão, de silêncio, de cultura e de meditação, que favorecem o crescimento da vida interior e cristã” (CIC nº 2186).

As Escrituras enfatizam especialmente a ligação entre descanso e adoração: “O sábado é para o Senhor, santamente reservado ao louvor de Deus, da sua obra criadora e das suas acções salvíficas a favor de Israel” (CIC nº 2171) A adoração é a forma mais elevada da actividade humana porque reconhece que a Graça de Deus é a fonte e o fim da nossa vida, e o que a sustenta. Adorar a Deus durante o nosso tempo de descanso não é mais uma “actividade” entre outras, mas um acto de fé através do qual nos lembramos que Deus, não nós mesmos ou o nosso trabalho, está no controlo da nossa existência. Depois de cumprirmos os nossos deveres, somos convidados a confiar que Deus cuida de nós e que a Sua providência vai muito além da nossa capacidade de resolver problemas e os muitos erros que cometemos no processo. Somente quando defendemos a primazia do amor e da misericórdia de Deus sobre as nossas vidas, manifestados por Cristo, podemos realmente encontrar descanso.

Nos últimos séculos, os escravos dos Estados Unidos encontraram consolo ao cantarem canções “gospel”, fortemente influenciadas pelos ritmos e pelas ancestrais e tradicionais músicas africanas. O conteúdo bíblico destas canções fez elevar-lhes o espírito, criou solidariedade entre si e fortaleceu o seu desejo de liberdade. Cantavam durante o tempo de descanso e adoração, mas também durante a execução de trabalhos forçados, pois enquanto cantavam sentiam-se preciosos e dignos aos olhos de Deus.

Enquanto católicos, experimentamos a essência do conceito bíblico de “descanso” na Eucaristia. Cristo – presente na Palavra das Escrituras e na Partição do Pão – dá-nos a força necessária para enfrentarmos a nossa vida, iluminarmos as nossas trevas, consolarmos a nossa solidão, curarmos as nossas feridas, enviando-nos de volta para o nosso quotidiano renovados e com um claro senso de direcção. Que a Eucaristia se torne o projecto sobre o qual iremos planear as férias de Verão!

Pe. Paolo Consonni, MCCJ

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