Expurgar o mal interior (Mateus 3, 1–12)
Todos os anos, no Segundo Domingo do Advento, a liturgia oferece-nos a pregação de João Baptista. Ele preparou o povo de Israel para a vinda do Messias. Assim, também hoje, ele ensina-nos a acolher a vinda do Senhor. Hoje, como então, o passo mais difícil a dar é compreender a necessidade de sair do lugar onde estamos acomodados, abandonar a falsa segurança religiosa e teológica que construímos e acolher a novidade da Palavra de Deus.
Antes de nos aprofundarmos nos detalhes da pregação de João, gostaria de chamar a atenção para as metáforas usadas para se referir a João Baptista. Ele é referido como «uma voz que clama no deserto». Por que alguém é referido como uma voz? A voz tem uma natureza fugaz. Uma vez que algo é pronunciado, desaparece e, no deserto, desaparece mesmo sem eco! Naqueles dias, não tínhamos sistemas de gravação de voz. Isto indica o propósito de João. Ele estava lá apenas para anunciar a vinda do Messias e “desaparecer de cena”. Essa também é a missão de todo o cristão. Como uma voz, precisamos anunciar o Messias ao povo e retirarmo-nos, ou seja, abstermo-nos de qualquer protagonismo.
Voltando à missão de João Baptista, nem todos responderam bem ao seu convite. Nem todos estavam dispostos a fazer uma mudança radical no coração. Os fariseus e saduceus, por exemplo, embora intrigados com a pregação de João, achavam difícil envolver-se naquele projecto de vida. Não confiavam nele, mas preferiam manter as suas certezas (versículos 7 a 10). Pensavam que já estavam bem com Deus pelo facto de serem filhos de Abraão.
A repreensão com que o Baptista recebe os fariseus e saduceus é severa: «Raça de víboras!». Ele compara-os a cobras que injectam o seu veneno mortal naqueles que inadvertidamente delas se aproximam. Depois, passa à invectiva, ao anúncio dos desastres que estão prestes a atingi-los. Correm o risco de ser cortados como uma árvore que não dá frutos e de serem queimados como palha. Estamos perante imagens dramáticas que parecem refutar o sonho de Isaías na primeira leitura.
O tom é ameaçador, o que não é surpreendente na boca de João Baptista. Os pregadores daquela época expressavam-se dessa maneira. Esta é a linguagem que aparece frequentemente na Bíblia. No contexto de todo o Evangelho, as palavras do precursor assumem um significado que vai além do imediato.
Quando falava da ira de Deus, João não tinha uma ideia clarividente de como ela se manifestaria. A ira de Deus é uma imagem que recorre frequentemente no Antigo Testamento. Não se trata de uma explosão de ódio contra a vítima. É uma expressão do amor de Deus: Ele está a combater o mal, não a pessoa que o pratica. Ele não quer atingir a pessoa, mas libertar cada um do pecado.
O machado, que corta as árvores pela raiz, tem a mesma função que Jesus atribui à tesoura que poda a videira e a liberta dos ramos inúteis que a privam da seiva preciosa e a sufocam (cf. Jo., 15, 2). As árvores arrancadas e lançadas ao fogo não são as pessoas que Deus ama sempre como filhos, mas as raízes do mal que estão presentes em cada pessoa e em cada estrutura, e precisam ser cortadas em pedaços para que das saudáveis possam brotar mais rebentos (cf. Mt., 3, 10).
Os cortes são sempre dolorosos, mas os feitos por Deus são providenciais. Eles criam as condições para que novos ramos brotem e produzam frutos.
O vento, finalmente, com o qual o Senhor realiza o seu julgamento, é uma imagem viva. Ele descreve a maneira como Deus examina o trabalho de cada pessoa. Nos tribunais humanos, os juízes levam em conta apenas os erros e pronunciam o julgamento com base no dano causado. Levam pouco em consideração as boas obras. No julgamento de Deus, acontece exactamente o oposto: Ele, com o aventador da sua palavra, coloca cada pessoa sob o sopro discernidor do seu Espírito, que remove o joio e deixa apenas os grãos preciosos na eira – as obras de amor, poucas ou muitas, que cada um realizou.
Pe. Jijo Kandamkulathy, CMF

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