A alegria de os conhecer
Há uma semana, um grande amigo meu, professor da Faculdade de Economia da Universidade dos Açores, foi ordenado diácono (com outros, que não conheço). Ontem, um dos meus melhores alunos na Licenciatura e no Mestrado em Engenharia Mecânica no Técnico (Universidade de Lisboa) foi ordenado padre (juntamente com outros). Não é pequeno o número de engenheiros, economistas, médicos… que conheci na Universidade e que hoje são padres.
Alguma Comunicação Social pretende convencer-nos de que os católicos são gente pouco interessante, ou dominada por alguma fragilidade efectiva, mas a realidade que conheço é diferente.
Outro exemplo: em visita recente a Castel Gandolfo, Leão XIV prestou homenagem ao Papa Pio XII pela sua coragem durante a Segunda Guerra Mundial, lembrando que recolheu ali cerca de dez mil judeus, entre 1943 e 1944, para os proteger da perseguição nazi. Estima-se que salvou mais de oitocentos mil judeus no mundo inteiro, entre os quais duzentos mil foram escondidos em instituições religiosas em França.
Certos jornais insistem em que Pio XII e a Igreja só se preocuparam com as vítimas da Esquerda radical, ignorando a perseguição nazi. No entanto, a realidade e o testemunho de muitos judeus teimam em mostrar que Pio XII não olhou apenas para os crimes da Esquerda radical.
Recordo uma visita desagradável ao Museu do Holocausto, em Jerusalém – um monumento dedicado ao ódio. Em primeiro lugar, ódio dos nazis contra os judeus; em seguida, ódio dos judeus contra os nazis e outros, com a sugestão adicional de que, depois de o povo judeu ter sofrido tanto, tem direito a conquistar outros territórios.
O Museu do Holocausto não conserva praticamente testemunhos das vítimas, talvez porque seja difícil destacar histórias singulares no meio daquela multidão massacrada pelos nazis, mas, em contrapartida, preenche quase todo o espaço com fotografias enormes dos responsáveis nazis: o Wolfgang fez isto…, o Herman fez aquilo…, o Rolf aqueloutro… Uma frase gigante aponta o dedo a todo o povo alemão, sem sequer limitar no tempo essa vergonha colectiva.
Pensei, por contraste, na memória cristã dos mártires, que nos propõe o seu amor e fidelidade, não a maldade dos algozes.
Há poucos minutos, no momento em que escrevo, Leão XIV afirmou, num tom de voz firme e calmo, a sua indignação pela crueldade que se abate sobre o Oriente, «com uma veemência diabólica que nunca se tinha visto», evocando os cristãos da Ucrânia e do Médio Oriente, nomeadamente «a situação trágica e inumana de Gaza».
A Igreja mantém os braços abertos a «todos, todos, todos!», como repetiu o Papa Francisco na Jornada Mundial da Juventude em Lisboa. Entre esses tantos, há pobres, há criminosos, há viciados, gente agressiva, inculta, preguiçosa… e também génios, artistas, pessoas de uma generosidade sem fim… Tive a sorte de conhecer muitos destes, que são, para mim, um ensinamento e uma inspiração. Sobretudo, admiro neste povo numeroso, com tantas virtudes e também defeitos, esta característica peculiar: olha com estima para os outros e esforça-se por perdoar.
José Maria C.S. André
Professor do Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa
LEGENDA: O bispo de Angra, D. Armando Esteves, e um grupo de diáconos, recém-ordenados. Entre eles, o meu amigo, professor Francisco Silva.