PAPA DENUNCIA EXPLORAÇÃO SEXUAL DE MULHERES E APONTA O DEDO ÀS POLÍTICAS MIGRATÓRIAS
O Papa foi recebido ao início da manhã de ontem na sede do Governo tailandês e perante o Primeiro-Ministro Prayut Chan Ocha e o corpo diplomático acreditado no País não se fez rogado. Francisco denunciou a exploração sexual de mulheres e crianças, e pediu às autoridades de Banguecoque políticas mais humanas de acolhimento dos migrantes e refugiados.
Centenas de pessoas desafiaram ontem o Sol tórrido de Banguecoque para saudar o Papa Francisco no curto percurso que o Sumo Pontífice efectuou no interior das instalações do Hospital de São Luís, instituição que completou recentemente 120 anos e que encarna como poucas a dimensão social da Igreja Católica na Tailândia.
Fundado em 1898 pelo então Vigário-Apostólico do Sião, o arcebispo D. Louis Vey, o Hospital de São Luís é actualmente um dos centros hospitalares mais avançados da Tailândia e continua a desenvolver a sua missão ao abrigo do lema com que foi fundado em finais do século XIX: “Onde há amor, também há Deus”.
Perante uma audiência de mais de sete centenas de funcionários e pacientes do hospital, o líder da Santa Sé considerou uma bênção «poder testemunhar em primeira mão o valioso serviço que a Igreja Católica oferece ao povo tailandês, particularmente aos mais necessitados».
O Santo Padre evocou o lema eleito por D. Louis Vey em 1898 para defender que a caridade e a entrega ao outro pontificam entre os melhores exemplos do trabalho missionário que está inerente à mensagem de Jesus Cristo. «É precisamente no exercício da caridade que nós, os cristãos, somos chamados a demonstrar que somos discípulos e missionários. Esta chamada é também um teste à nosso própria fidelidade, e à fidelidade das nossas instituições, a esse sentido de missão», defendeu o Pontífice no auditório da instituição hospitalar. «Vós sois discípulos e missionários no campo da saúde», afirmou.
Durante a breve visita que realizou ao Hospital de São Luís, o Papa fez uma visita privada a alguns dos pacientes que se encontram actualmente em convalescença na unidade hospitalar, uma forma, notou Francisco, «de os acompanhar, ainda que muito brevemente, na sua dor».
Antes de proferir o discurso em que qualificou os funcionários do hospital como «discípulos de Cristo», o Pontífice quebrou por breves momentos o protocolo e desceu do papamóvel para abençoar alguns pacientes de cadeira de rodas que se encontravam entre a multidão que acolheu Francisco na chegada as instalações hospitalares. Foi então acolhido por centenas de pessoas, entre crianças de várias escolas da capital tailandesa e pequenos grupos de católicos oriundos de outras zonas da Tailândia e de países como o Camboja ou o Vietname. Entre os que aguardavam a chegada do Papa estava um pequeno grupo de missionários norte-americanos da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, um movimento religioso restauracionista iniciado nos Estados Unidos que reconhece o Papa como o líder religioso «que mais perto está de Deus». «Esta visita é muito importante para todos quantos comungam da fé católica, uma vez que permite que as pessoas se possam sentir próximas do líder da sua Igreja. Para os cristão, como é o nosso caso, os líderes são as pessoas que mais perto estão de Deus. Esta visita tem uma importância extraordinária nesse sentido e pode ser também importante para reforçar os esforços de evangelização conduzidos aqui na Tailândia», disse Eric Kim, a título pessoal, em declarações a’O CLARIM.
Contra a exploração sexual de mulheres e crianças
Antes da visita ao Hospital de São Luís, o Papa Francisco tomou posição face a um dos principais flagelos com que se confronta a Tailândia: o tráfico humano. No primeiro discurso oficial que proferiu no âmbito da deslocação de três dias a Banguecoque, o Papa lamentou que «mulheres e crianças continuem a estar particularmente vulneráveis e a ser violentadas e expostas a todas as formas de exploração, escravatura, violência e abuso».
As declarações foram feitas perante o Primeiro-Ministro Prayut Chan Ocha e o corpo diplomático acreditado na Tailândia. Apesar das críticas subjacentes ao discurso, Francisco reconheceu os esforços das autoridades tailandesas «para acabar com este flagelo, bem como o trabalho conduzido pelas pessoas e organizações que trabalham incansavelmente para erradicar este mal e oferecer às vítimas um caminho de dignidade».
Na mesma ocasião, também se referiu ao fenómeno da migração, tendo voltado a defender que a questão migratória e o acolhimento dos refugiados representam «pelas condições em que se desenvolve (…)alguns dos principais problemas morais que enfrentam as actuais gerações». «A crise migratória não pode ser ignorada», destacou o Pontífice, acrescentando que «a própria Tailândia, conhecida pelo acolhimento de migrantes e de refugiados, enfrentou esta crise devido à trágica fuga de países vizinhos».
A intervenção de Jorge Bergoglio adquire uma preponderância particular à luz das denúncias feitas recentemente pela organização não-governamental “Human Rights Watch” e pelo Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR). Os dois organismos denunciaram as condições em que vivem os paquistaneses cristãos e a minoria muçulmana ahmadi, que fugiram do País por serem perseguidos pela fé que professam, e aos quais a Tailândia continua a negar o estatuto de refugiado.
Ao final da tarde, o Papa Francisco esteve reunido com o Rei Maha Vajiralongkorn. O encontro privado antecedeu a celebração, ao início da noite, de uma eucaristia no Estádio Nacional Supachalasai, local onde o Papa João Paulo II também presidiu a uma missa no âmbito da histórica visita que efectuou à Tailândia em 1984. Entre os mais de quarenta mil fieis que assistiram à cerimónia esteve uma delegação de doze luso-descendentes oriundos de Malaca, liderada por Joseph Santa Maria. «Uma delegação de 34 membros da comunidade portuguesa de Malaca esteve em Novembro de 2016 no Vaticano para testemunhar o fecho da Porta Santa e a nomeação do primeiro cardeal malaio. Desta vez, e aproveitando a deslocação do Santo Padre à Tailândia, também nos organizámos. Embora só sejamos doze, esta visita também vai ficar para sempre nos nosso coração», garantiu Joseph Santa Maria. «Agora só fica a faltar uma visita do Papa Francisco à Malásia. Se algum dia vier a acontecer, espero que inclua Malaca no seu percurso. Foi lá que tudo começou e os portugueses de Malaca são os guardiães do Catolicismo na Malásia», defendeu em declarações a’O CLARIM.
Marco Carvalho
em Banguecoque