SEMPRE COM OS CRISTÃOS, OS NÃO-CRISTÃOS E OS JOVENS NO CORAÇÃO
Nestes tempos em que as notícias se sucedem às notícias, a uma velocidade vertiginosa, pergunto-me muitas vezes o que fica realmente das palavras do Santo Padre dentro de nós, das suas múltiplas visitas ao estrangeiro. E falo de todos nós porque as palavras do Papa têm sempre alcance universal, independentemente da comunidade concreta a que se dirige.
Porque admiro o Santo Padre, como milhões de pessoas em todo o mundo, sempre me perguntei de facto o que resta das suas mensagens, na consciência de quem o ouve, nos diferentes caminhos do mundo que ele vai percorrendo, com o seu cajado de pastor.
Decidi, por isso, dedicar duas das minhas últimas crónicas de 2019 n’O CLARIMàs mensagens essenciais do Santo Padre, no decurso das diversas viagens ao estrangeiro, no ano prestes a findar.
O Papa visitou sucessivamente o Panamá (23 a 27 de Janeiro); os Emirados Árabes Unidos (3 a 5 de Fevereiro); Marrocos (30 a 31 de Março); Bulgária e Macedónia do Norte (5 a 7 de Maio); Roménia (31 de Maio a 2 de Junho); Moçambique, Madagáscar e Maurícia (4 a 10 de Setembro); e finalmente a Tailândia e o Japão (20 a 26 de Novembro).
As razões da escolha de tais destinos são múltiplas, desde a sugestão das hierarquias católicas de cada país, convites independentes das autoridades nacionais, celebração de acordos ou declarações de relevância internacional, política ou inter-religiosa – quer as visitas tenham a ver ou não com a importância das comunidades católicas locais.
Como é óbvio, não existe Igreja onde não existem católicos, pelo que se pode dizer, sem sombra de dúvida, que a primeira atenção do Papa, em cada país visitado, vai para os seus irmãos e irmãs na Fé: não há visita sem a celebração missa, em recintos normalmente amplos, e sem encontro com os bispos, sacerdotes e religiosos, monges e monjas, conforme os casos.
JORNADA MUNDIAL DA JUVENTUDE
No calendário do Papa, cada dois ou três anos está, desde João Paulo II, inscrita a Jornada Mundial da Juventude.
Como tudo começou? Em 1984, no final do Ano Santo da Redenção, mais de trezentos mil jovens de todo o mundo responderam ao convite de Sua Santidade João Paulo II para um Jubileu internacional de jovens no Domingo de Ramos na Praça de São Pedro.
Olhando para as multidões que responderam ao seu convite, João Paulo II disse: «Que espectáculo fantástico é apresentado neste lugar, com o vosso encontro aqui! Quem afirmou que a juventude de hoje perdeu o sentido de valores? É realmente verdade que os jovens não respondem ao chamamento?».
Foi nessa reunião que o Santo Padre confiou aos jovens o que hoje é conhecido como a Cruz da Jornada Mundial da Juventude, para ser transportada por todo o mundo como um símbolo do amor de Cristo pela Humanidade.
João Paulo II deixou um legado aos jovens, ao instituir a Jornada Mundial da Juventude, que o Papa Bento XVI continuou e Francisco continua fielmente, levando a esperança de seu antecessor para os jovens do mundo, convidando-os e mandatando-os como discípulos de Cristo, para serem fiéis testemunhas vivas.
Qual a mensagem do Papa, deste ano? Os jovens são o “agora” do mundo, disse Francisco que reflectiu sobre a importância dos jovens para a sociedade. E sublinhou que os jovens presentes não são reservados apenas para amanhã. Os jovens, disse ele, «são um já hoje, preparando um amanhã. Eles não estão “entretanto”, mas são o “hoje”, o “agora”, da Igreja e do mundo».
O Papa disse que também apelou aos adultos para educar e formar jovens adequadamente, para que eles possam encontrar trabalho e um lugar na sociedade.
Esta ênfase posta na juventude não pode ser mais actual, e não apenas como figura de retórica, quando testemunhamos o seu papel em movimentos cada vez mais decisivos, como é o combate às alterações climáticas.
EMIRADOS ÁRABES UNIDOS
Em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, o Papa procedeu à formalização de um documento fundamental, a declaração conjunta que assinou com Ahmed el-Tayeb, grão-imã de al-Azhar, durante uma reunião inter-religiosa.
Tal declaração solene reconhece a importância da religião (de todas as religiões) na construção de uma sociedade pacífica e livre e os desafios de um mundo cada vez mais secular, condenando todas as práticas e políticas prejudiciais à vida e à liberdade humanas.
Num parágrafo sobre liberdade humana, o documento afirma que a pluralidade religiosa é desejada por Deus. “O pluralismo e a diversidade de religiões, cor, sexo, raça e linguagem são desejados por Deus em Sua sabedoria, através da qual Ele criou seres humanos”, afirma o documento.
Na reunião inter-religiosa, o Papa Francisco disse que pessoas de diferentes religiões devem trabalhar para construir o futuro juntos «ou não haverá futuro».
«Chegou o momento em que as religiões devem ser praticadas mais activamente, com coragem e audácia, e sem pretensões, para ajudar a família humana a aprofundar a capacidade de reconciliação, a visão de esperança e os caminhos concretos da paz», disse o Papa.
Este capítulo da actividade “diplomática”, a do diálogo inter-religioso do Santo Padre, ficará a marcar seguramente um dos momentos mais altos do seu pontificado. Porque importa contextualizar esta questão.
A Declaração de Abu Dhabi responde a pontos mais do que contenciosos do nosso tempo: afirmando que as religiões podem trabalhar em conjunto para a paz no mundo, contrariando assim a sua natureza irreconciliável; e negando desse modo legitimidade à violência como instrumento da expansão de qualquer credo.
Atenta à importância das organizações terroristas de inspiração religiosa no quadro internacional, a Declaração sobre a Fraternidade Humana aponta caminhos de reconciliação histórica, indispensáveis para a construção do futuro.
MARROCOS
O Papa Francisco visitou Marrocos para destacar os laços de amizade para com a nação muçulmana do Norte de África, além de demonstrar solidariedade aos migrantes, às portas da Europa, e visitar igualmente a pequena comunidade católica.
Disse o Papa: «Queridos amigos marroquinos, venho como um peregrino da paz e da fraternidade.(…)Nós, cristãos e muçulmanos, acreditamos em Deus, o Criador e o Misericordioso, que criou pessoas para viver como irmãos e irmãs, respeitando-se em sua diversidade e ajudando-se mutuamente nas suas necessidades».
Como se vê, a visita teve lugar logo após a viagem aos Emirados Árabes Unidos, em Fevereiro, onde o Papa e o imã de Al Azhar assinaram a referida declaração, consagrando a relação fraterna entre católicos e muçulmanos e outras religiões.
PERSPECTIVA
Na próxima crónica concluirei este itinerário internacional do Papa Francisco, com as visitas à Bulgária e Macedónia do Norte (5 a 7 de Maio); Roménia (31 de Maio a 2 de Junho); Moçambique, Madagáscar e Maurícia (4 a 10 de Setembro); e finalmente à Tailândia e o Japão (20 a 26 de Novembro).
Mas permito-me voltar a sublinhar, pela sua inegável dimensão histórica para futuro, a grande importância da viagem do Santo Padre a Abu Dhabi.
Carlos Frota