Bispo preparou a Diocese para o pós-1999

Diplomata, inteligente e amigo.

O último bispo português de Macau, D. Arquimínio Rodrigues da Costa, teve a visão de preparar a Igreja do território para o período pós-1999. O padre João Lau, José Luís Sales Marques, Eduardo Tavares, José Maria Bártolo e Evaristo Antunes falam de um homem paciente, compreensivo, virtuoso, tolerante, recto e bondoso.

João Lau, pároco de São Lázaro, entrou em contacto com o então padre Arquimínio Rodrigues da Costa nas aulas de Filosofia, ministradas no Seminário de São José. «Era uma boa pessoa. Tinha muita paciência. Dava-nos as aulas em Latim. Fora delas falava comigo em Cantonense. Dominava muito bem [o dialecto]», recordou, em declarações a’O CLARIM.

Na memória do padre Lau está também a deslocação a Pequim: «Éramos dez pessoas. O bispo recebeu o convite da China, mas no princípio não queria aceitar, dizendo ao Governo chinês que o seu grande amigo [bispo de Xangai] estava ainda na prisão. Acabou por ir e, num gesto de boa-vontade, o bispo Kong saiu da prisão, também porque as autoridades chinesas já tinham intenção de o libertar».

No seu entendimento, D. Arquimínio foi uma pessoa da transição de poderes de Macau para a China. «Por um lado está certo, visto ter sido responsável pela criação de vários centros pastorais, especialmente dirigidos à comunidade chinesa, tais como o Centro Pastoral Diocesano para a Juventude».

A última vez que esteve com o bispo emérito de Macau foi há três anos, ao integrar uma comitiva que se deslocou à ilha do Pico, nos Açores. «Lembrou-se de coisas antigas e de pessoas conhecidas. Falou comigo em Cantonense. Ainda falava bem. Tinha saudades de Macau», descreveu o padre Lau, lembrando que foi D. Arquimínio quem ordenou o sucessor, D. Domingo Lam, como bispo-coadjutor, e D. José Lai, como bispo-auxiliar.

A memória que José Luís Sales Marques tem de D. Arquimínio como bispo é a de uma «pessoa discreta e simples», que teve um «papel importante na Igreja de Macau no período da pré-transição» para a China. «Era, com certeza, um homem inteligente, que resignou em 1988, logo após a assinatura da Declaração Conjunta em 1987. Não sei em que circunstâncias terá resignado, mas numa leitura mais simplista diria que abriu caminho ao primeiro bispo de etnia chinesa, D. Domingos Lam, para assumir a diocese de Macau. Teve a visão de preparar o futuro», enalteceu o presidente do Leal Senado e da Câmara Municipal de Macau Provisória entre 1993 e 2001.

 

Seminário

O derradeiro bispo português de Macau foi, segundo Eduardo Tavares, «uma criatura quase perfeita, com muitos dotes, imensas qualidades e muitas virtudes. Sabia de tudo: línguas, muitas. Artes, em especial a música, o teatro e a poesia. Foi dotado, mas não deixou cair a semente em terra árida. Procurou desenvolvê-las, daí as qualidades que reconhecemos. Até violino sabia tocar».

Ademais, «tinha grande paciência com os outros e muita compreensão. Tratava as pessoas como seres humanos. Nunca reparei que fizesse alguma diferenciação entre raças, cores, nacionalidades e até credos. Era admirado, respeitado e até amado por todos», frisou o antigo aluno do Seminário de São José.

«Foi professor de Latim, de Português, de Francês, de Filosofia e de Direito Canónico. Contribuiu para a formação de muitos alunos do Seminário de São José, internos e externos, não só em termos religiosos, como também para a formação cívica», disse ainda.

Em 1968, o então padre açoriano foi ensinar para o Seminário do Espírito Santo, da diocese de Hong Kong. Regressou em 1973, após a morte do bispo D. Paulo José Tavares, também dos Açores, mas de São Miguel.

«O cabido de Macau elegeu Arquimino como vigário capitular. Ordenado bispo a 25 de Março de 1976, posso dizer que se manteve igual a si próprio, dedicando-se de alma e coração ao governo da Diocese e às correspondentes lides pastorais e educacionais», lembrou Eduardo Tavares, acrescentando: «contribuiu com mão de mestre para transição do governo do seu predecessor, preparando o caminho para a governação futura da diocese de Macau».

José Maria Bártolo, também antigo seminarista, conheceu Arquimínio Rodrigues da Costa como sacerdote e reitor do Seminário de São José, não tendo muita ligação com ele enquanto bispo.

Enaltecendo as qualidades intelectuais e humanas, abordou o tempo em que foi seu aluno no primeiro ano de Filosofia: «Em termos gerais, diria que primava pela simplicidade. Era muito franco no trato e tinha um carácter muito recto e bondoso. Como sacerdote e perfeito [de disciplina] falava com os alunos [internos] depois do jantar. Gostávamos de ouvi-lo. E como professor e reitor do seminário, velava pelos alunos. Tive sempre boa impressão dele», vincou.

«Era um homem muito intelectual. Gostava de falar muito sobre assuntos filosóficos com o padre Júlio Augusto Massa [director d’O CLARIM entre Julho e Novembro de 1948], dando disso conta quando iniciava as aulas connosco», recordou.

Evaristo Antunes não foi seminarista, mas quando era menino e moço frequentava os retiros que havia no seminário durante a Páscoa. «O padre Arquimínio e o padre Mendes [director d’O CLARIM por três ocasiões] foram dois sacerdotes que me marcaram muito. O primeiro, por ser mariano. Falava muito de Maria. E o segundo, por ser muito efusivo a pregar», sublinhou o voluntário do Movimento dos Focolares em Macau.

PEDRO DANIEL OLIVEIRA
pedrodanielhk@hotmail.com

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