Elias, o protótipo de um profeta (1 Reis 17, 1-6)
Embora o profeta Elias não tenha escrito qualquer livro bíblico, escolhi começar apresentando-o como um modelo de ministério profético. Elias é frequentemente comparado a Moisés, considerado um dos maiores profetas do Antigo Testamento. Significativamente, tanto Elias como Moisés, aparecem juntos no Monte Tabor durante a transfiguração de Jesus, simbolizando a continuidade entre a Lei e os Profetas.
A ÉPOCA DE ELIAS
Elias exerceu o seu ministério profético no Reino do Norte de Israel. Ao contrário do Reino do Sul de Judá, que manteve uma dinastia davídica contínua, o Reino do Norte foi marcado por violentas lutas pelo poder e frequentes mudanças de regime. Durante a era de Elias, o rei Acabe (que reinou de 874 a 853 a.C.) governou Israel. Casou com Jezabel, filha do rei Sidónio, que era uma devota adoradora de Baal. Sob a influência destes, a adoração a Baal espalhou-se rapidamente por todo Israel, provocando uma crise espiritual (cf. 1 Reis 16, 31-33).
Durante o reinado de Acabe, Israel experimentou um “boom” na agricultura, na indústria e na construção. Acabe comprou a colina de Samaria e ali construiu a cidade de Samaria, estabelecendo-a como a nova capital (cf. 1 Reis 16, 24). No entanto, essa prosperidade teve um custo espiritual e moral. Um século depois, o profeta Amós denunciaria a opulência e a complacência de Samaria, condenando seu estilo de vida luxuoso e as injustiças sociais.
O CHAMAMENTO DE ELIAS (cf. 1 Reis 17, 1-6)
Elias, o tisbita, de Tesba, em Gileade, disse a Acabe: «Tão certo como vive o Senhor, o Deus de Israel, a quem sirvo, não haverá orvalho nem chuva durante os próximos anos, até que eu ordene!» (1 Reis 17, 1).
A palavra do Senhor veio a Elias: “Saia daqui, vá para o leste e esconda-se no Wadi Cherith [Riacho de Querite, em Português], a leste do Jordão. Vós bebereis do wadi, e eu ordenarei aos corvos que lá o alimentem”.
Então ele partiu e fez como o Senhor havia ordenado: permaneceu no Wadi Cherith, a leste do Jordão.
Os corvos traziam-lhe pão e carne pela manhã, e pão e carne à noite, e ele bebia do wadi.
A MISSÃO PROFÉTICA DE ELIAS
A seca serve como um desafio directo aos Baals – os ídolos locais adorados pelos cananeus e fenícios como deuses da tempestade. Acreditava-se que estas divindades controlavam o trovão, o relâmpago e a chuva, e eram creditadas por trazer fertilidade e renovar a natureza. Baal, em particular, era reverenciado como o governante do mundo natural, incorporando as forças que sustentavam a vida agrícola.
À medida que os israelitas se estabeleceram na terra e começaram a cultivá-la, encontraram a forte influência da religião e da cultura cananeias. Neste contexto, Yahweh era frequentemente reduzido a apenas um entre muitos deuses – lembrado principalmente como a divindade ancestral que os libertou da escravidão e os guiou através do deserto. Mas agora, diante das exigências da vida agrícola, foram atraídos por Baal, um deus que parecia prometer chuva, fertilidade e prosperidade. A tentação era poderosa.
A missão profética de Elias era chamar o povo de volta à devoção exclusiva a Yahweh, demonstrando que somente Ele é o verdadeiro Senhor da chuva, da fertilidade e da própria vida.
O Senhor chama por Elias – cujo nome significa “Yahweh é o meu Deus” – durante um período de seca e o envia para o Wadi Cherith, onde será sustentado com água e comida. Neste lugar escondido, Deus cuida ternamente de Elias durante um período de retiro. É um tempo de solidão com o Senhor, um espaço sagrado para oração e preparação antes das provações que estão por vir.
Assim como Moisés passou anos no deserto de Midiã, antes de ser enviado para libertar Israel da escravidão, e São Paulo passou um tempo no deserto de Nabateia, antes de encontrar os apóstolos em Jerusalém, Elias passa por sua própria formação em Querite. O próprio nome Querite significa “separação” ou “corte” – um símbolo poderoso do profeta sendo separado. Ele é retirado do povo, consagrado e transformado para uma missão divina.
Este ritmo de separação e envio está no cerne da consagração. Somos chamados, afastados do comum e aproximados do coração de Deus – não para permanecer escondidos, mas para sermos enviados. Neste processo de consagração, Deus remodela-nos, alinhando a nossa visão com a Sua e a nossa paixão também com a Sua. Elias emerge de Querite como um homem de Deus (cf. 1 Reis 17, 18), pronto para enfrentar reis, invocar o fogo e restaurar a aliança.
REZANDO COM A PALAVRA DE DEUS
Vivemos num mundo repleto de Baals modernos – falsos ídolos que prometem realizações, mas que nos deixam espiritualmente estéreis. A nossa era é cada vez mais moldada pela tecnologia, onde a inteligência artificial nos tenta a terceirizar o nosso intelecto, diminuindo a nossa capacidade de reflexão profunda e pensamento autêntico. Muitas crianças crescem rodeadas de telas, mas privadas de abraços, calor humano e da presença acolhedora de um verdadeiro lar.
Vivemos numa sociedade em que o subjectivismo é amplificado e a liberdade pessoal é exaltada como um absoluto. Tal leva ao que o Papa Bento XVI descreveu, apropriadamente, como a “ditadura do relativismo” – uma cultura em que a verdade não está mais ancorada e tudo se torna negociável.
Ideologias como a teoria de género e outras desafiam as verdades fundamentais da identidade e dignidade humanas, tentando-nos a esquecer que só Jesus Cristo é «o caminho, a verdade e a vida» (João 14, 6). Em meio a essa confusão, a voz profética é mais necessária do que nunca – para nos chamar de volta Àquele que, sozinho, dá sentido, direcção e vida.
1. Onde está o seu Wadi Cherith? Vamos experimentá-lo… Reserve um tempo para reflectir sobre os ritmos sagrados do retiro e da missão na sua vida. Onde o Senhor o levou à solidão para moldá-lo, refiná-lo e prepará-lo? E como Ele o enviou novamente, transformado e renovado?
2. Como vós vendes nutrindo a fé em Jesus Cristo? Considere cultivar um relacionamento vivo com Ele no meio do barulho da vida moderna. Como lida com as filosofias e correntes culturais predominantes de hoje – elas aproximam-no da verdade ou distraem-no dela?
3. Que Baals enfrenta diariamente? Identifique os falsos deuses que subtilmente exigem a sua lealdade – conforto, controlo, reconhecimento ou distracção. Que ídolos o tentam a comprometer a sua identidade em Cristo e como é que o Senhor o chama a derrubá-los?
Pe. Eduardo Emilio Agüero, SCJ