“VINDE E VEDE”: UMA VIAGEM MISSIONÁRIA AO CORAÇÃO DE ORIXÁ

“VINDE E VEDE”: UMA VIAGEM MISSIONÁRIA AO CORAÇÃO DE ORIXÁ

Um desejo realizado

Por mais de uma década, Orixá (Odisha) ecoou no meu coração missionário. Ouvi falar desta região pela primeira vez através de notícias que relatavam a perseguição de cristãos por grupos extremistas. As histórias de minorias tribais que sofriam tormentos, por causa da sua fé, tocaram-me profundamente. Embora tenha sido nomeado para o nosso distrito indiano há cerca de vinte anos, a Divina Providência redireccionou o meu caminho para a Argentina e depois para Macau, na China, e nunca cheguei à Índia. No entanto, o desejo de um dia ir a Orixá nunca me abandonou.

A oportunidade surgiu em 2019, quando o meu amigo, padre Mathews Vandassary, SCJ – que serviu ao nosso lado durante os primeiros anos da nossa missão em Macau – foi enviado a Orixá com dois diáconos para estabelecer a presença dos Padres do Sagrado Coração de Jesus numa das províncias mais pobres da Índia. Ao mesmo tempo, as Pequenas Irmãs de Maria de Nazaré, das quais sou director espiritual, estavam a discernir novos lugares para expandir o seu carisma. Como três das irmãs são indianas, perguntei ao padre Mathews sobre a possibilidade de uma fundação em Orixá. Sem hesitar, o padre “Mathay”, como o chamamos carinhosamente, respondeu com as palavras de Jesus aos discípulos de João Baptista: «Vinde e vede». E assim, viajei para lá com a Irmã Pauly.

PLANTANDO SEMENTES EM SOLO DURO

A viagem do pequeno aeroporto de Jagdalpur até a aldeia do padre Mathay foi inesquecível. Vacas vagueavam livremente pela estrada, imperturbáveis e soberanas. Ao anoitecer, o nosso motorista contornava-as, desviando-se de motociclistas imprudentes e dos faróis ofuscantes dos camiões. O trecho final era lamacento e sem pavimentação, agravado pelas chuvas recentes. Após mais de vinte horas de viagem desde Hong Kong, chegámos a uma humilde capela onde o padre Mathay nos esperava, juntamente com crianças, jovens e alguns adultos. Eles receberam-nos com guirlandas de flores e canções alegres.

O padre Mathay partilhou a história da sua missão na diocese de Rayagada, onde foram enviados para uma área remota com apenas algumas famílias cristãs protestantes. «– Vivíamos numa casa alugada e relacionavamo-nos com quatro famílias que trabalhavam nas proximidades», contou-me. «– Convidámo-las para a Santa Missa e ensinámos-lhes a nossa fé católica durante um ano. Por fim, pediram o Baptismo e trouxeram as suas famílias alargadas, que também abraçaram a fé».

Estes episódios aconteceram durante a pandemia de COVID-19, e a comunidade cresceu lentamente. Com o apoio de benfeitores em Kerala, forneceram alimentos aos pobres, prepararam refeições e percorreram as ruas à procura de sem-abrigo e mendigos. Levaram os doentes aos hospitais e prestaram os devidos cuidados. Inicialmente, os diáconos envolvidos ficaram desanimados, pois ansiavam por um trabalho pastoral mais tradicional. Mas o padre Mathay lembrou-lhes que servir os pobres é fundamental para o diaconato e a vida missionária: «– Devemos ser como o diácono Filipe, em Actos 8, 4, levando a Igreja onde Jesus ainda não é conhecido».

Após um ano neste ministério, os diáconos tornaram-se padres. Um deles, o padre John Sabon, SCJ, mais o padre Mathay e o irmão Matthews, foram enviados para Dudumbador, uma área missionária sem igreja ou capela, mas com quinze estações missionárias. «– Descobrimos que muitos tinham perdido a fé devido à ausência de padres e Sacramentos», explicou o padre Mathay, acrescentando: «– Começámos um programa de catecumenato, oferecendo seminários mensais ao longo de um ano. As famílias percorriam longas distâncias para participar. Também formámos potenciais líderes e, com a permissão do Bispo, administrámos os Sacramentos a muitos».

Até mesmo alguns protestantes pediram o Baptismo, juntamente com as suas famílias. Hoje, essas comunidades são totalmente católicas, participam regularmente na Missa e na Adoração Eucarística, com os seus próprios catequistas e líderes. O Bispo ficou tão satisfeito que abençoou duas capelas construídas com a ajuda do povo. Os missionários vivem simplesmente em quartos adjacentes às capelas, sem convento.

O EVANGELHO NA SIMPLICIDADE

No início, as crianças tinham medo deles. Mas, com o tempo, aproximaram-se. Os missionários visitavam as famílias, ajudavam nas necessidades mais prementes e usavam o carro como ambulância. Fiéis ao espírito do Padre Dehon, o seu fundador, estão agora a construir um centro de saúde. O padre Mathay recebeu uma doação de roupas bonitas para meninas de um amigo em Kerala, e elas agora participa na Missa, sentindo-se dignas e alegres. As crianças correm para cumprimentar os missionários na rua e algumas aqui se deslocam diariamente para comer ao meio-dia.

«– Estas tribos são esquecidas pelo Governo», lamentou o padre Mathay. «– As nossas estradas ficam quase intransitáveis durante a estação chuvosa. A educação é precária, não aprendem Inglês e os estudos superiores estão fora de alcance. São desprezados simplesmente por serem cristãos. A perseguição é uma ameaça constante, mas suportam-na com coragem e fé».

Na nossa missão, as relações com hindus e muçulmanos são pacíficas, ao contrário de outras partes de Orixá, onde a “lei anti-conversão” é mal utilizada pelos extremistas que se opõem às missões católicas – mesmo quando as conversões são escolhidas livremente. Os missionários católicos não procuram impor, mas sim partilhar as suas vidas e fé com estas comunidades tribais, chamadas “párias”. «– Os cristãos sabem que são discriminados», disse o padre Mathay, «mas aceitam esse sofrimento, sabendo que Jesus Cristo é o seu único Salvador».

Fiquei profundamente comovido com a simplicidade, a alegria e o amor que os meus confrades demonstravam pelos pobres. Disse-lhes que invejava a sua vida. Aqui não há computadores, nem Internet, nem televisão. Talvez seja por isso que as pessoas são tão puras e receptivas à Palavra de Deus. Com o padre Mathay, o padre John e o irmão Matthews, aprendi a ser pobre com os pobres e a abraçar a simplicidade do Evangelho de Jesus Cristo.

O CORAÇÃO DA MISSÃO

Nos recantos remotos de Orixá, onde as estradas desaparecem na lama e a perseguição paira, o Evangelho está vivo. Não é proclamado por grandes instituições, mas levado nos passos de humildes missionários – aqueles que caminham com os pobres, alimentam os famintos e baptizam com alegria. O seu testemunho é uma revolução suave, marcada pela dignidade, compaixão e fé inabalável. Na companhia deles, redescobri o coração da missão, ecoando as palavras de São Paulo: «Tão profundamente nos importamos convosco que estamos determinados a partilhar convosco não apenas o evangelho de Deus, mas também a nós mesmos, porque vos tornastes muito queridos para nós» (1 Ts., 2, 8).

Pe. Eduardo Emilio Agüero, SCJ

em Orixá (Índia)

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