Manter o equilíbrio entre o Rei e o Imperador: João II e Agapito I
JOÃO II
(31.XII.532/2.I.533 – 8.V.535)
O seu nome original provém do deus pagão Mercúrio, por isso o 56.º Pontífice Romano adoptou outro nome: João II. Foi o primeiro Papa a mudar de nome!
Demorou dois meses para que o Papa fosse escolhido e houve uma reclamação enviada a Atalarico (o rei ostrogodo de Itália) de que houvera alguma campanha eleitoral durante as eleições papais. O rei “então ordenou que o decreto do Senado contra o suborno nas eleições papais fosse gravado em mármore e colocado no pátio de São Pedro. Atalarico acrescentou ao decreto que, doravante, quando qualquer eleição papal contestada fosse levada a Ravena [onde o rei residia], uma quantia em dinheiro deveria ser paga – o dinheiro iria para os pobres” (Brusher & Borden, “Popes through the Ages”, pág. 112). Caporilli (“Os Pontífices Romanos”) acrescenta que Atalarico decretou que o Papa fosse reconhecido como o chefe dos bispos em todo o mundo.
O Papa conseguiu manter boas relações tanto com o rei em Ravena como com o Governo do Império Oriental em Constantinopla. O imperador oriental Justiniano Augusto, um católico devoto, enviou uma declaração da sua fé, escrita de sua própria mão, ao Papa (cf. Liber Pontificalis, pág. 143), acompanhada de alguns presentes, incluindo um cálice de ouro com pedras preciosas (cf. “Popes through the Ages”, pág. 112).
Uma importante discussão doutrinária que ressurgiu foi a frase “um da Trindade foi crucificado”. Esta fórmula tinha sido proposta pelos monofisitas, que defendiam que havia apenas uma natureza e uma Pessoa em Cristo (ver GUARDIÕES DAS CHAVES – 29). O Papa São Hormisdas (514-523) não aprovou a fórmula, não porque fosse totalmente herética, mas porque os monofisitas a estavam a usar para promover a sua causa. Foi esquecida por algum tempo, mas ressurgiu no tempo de João II.
Brusher & Borden (“Popes through the Ages”, pág. 112) explicam que “uma vez que [um dos membros da Trindade foi crucificado] estava a ser usada como slogan da ortodoxia contra os nestorianos [os rivais dos monofisitas], o Papa João II aprovou-a”. Horace Mann (Papa João II. The Catholic Encyclopedia. www.newadvent.org/cathen/08421b.htm) acrescenta que “foi defendida numa forma modificada por Justiniano [o imperador do Oriente] e contestada pelos Acoemetæ, ou ‘monges insones’. Mas eles [os Acoemetae] foram condenados pelo Papa [por defenderem o nestorianismo], que informou o imperador da sua acção (24 de Março de 534)”. Os Acoemetae eram uma ordem de monges cristãos orientais que se revezavam dia e noite para celebrar o serviço divino sem interrupção.
Após a sua morte, João II foi sepultado na Basílica de São Pedro, tal como o seu predecessor Bonifácio II.
SÃO AGAPITO I
(13.V.535 – 22.IV.536)
Recordemos que o Papa anterior, Bonifácio II, foi contestado por um rival chamado Dióscoro. O Papa seguinte era um apoiante de Dióscoro. Quando assumiu o Papado, Agapito ordenou a queima pública do decreto que Bonifácio havia emitido anatematizando Dióscoro.
Agapito é o segundo Papa a visitar Constantinopla (depois de João I, em 523), a pedido do Teodato, rei dos ostrogodos. Esta viagem mostra como o império e a religião estavam intimamente interligados.
O rei Teodato “pediu ao Papa que fosse a Constantinopla para implorar ao imperador Justiniano que cancelasse a ameaça de invasão da Itália. O Papa concordou em ir, ainda mais porque soube que os monofisitas mais uma vez ameaçavam Constantinopla. Ele até prometeu os vasos de ouro e prata de São Pedro para arrecadar os fundos necessários para a viagem” (Brusher & Borden, “Popes through the Ages”, pág. 114). A natureza da viagem era dupla: uma política e outra religiosa.
No que diz respeito ao lado político da viagem, o Papa não teve muito sucesso. O imperador Justiniano disse-lhe que era tarde demais, pois os preparativos para a invasão já estavam muito avançados.
Mas São Agapito conseguiu alcançar mais com o lado religioso da sua viagem. Conseguiu convencer facilmente o imperador, mas a esposa do imperador, que (ao contrário do imperador) abraçava o monofisismo, conseguiu que Antémio, um bispo com a mesma crença, fosse nomeado Patriarca de Constantinopla. O Papa Agapito conseguiu manter a sua posição e convenceu o imperador, que chegou ao ponto de ameaçar o Papa por causar problemas, a mudar de ideia. Justiniano permitiu que o Papa destituísse Antémio e consagrasse Menos (ou Minas). São Agapito I salvou assim Constantinopla novamente da heresia. Ele é honrado como santo não só no Calendário Romano, mas também no Grego.
O Papa já estava com a saúde debilitada e morreu antes de poder regressar a Roma (Caporilli, no entanto, afirma que ele foi envenenado pela imperatriz Teodora!).
Pe. José Mario Mandía
LEGENDA: Estátua do Papa Agapito I na vila francesa de Saint-Maixent-l’École.