CENTENÁRIO DA BEATIFICAÇÃO DOS MÁRTIRES COREANOS

CENTENÁRIO DA BEATIFICAÇÃO DOS MÁRTIRES COREANOS

Mortos em nome da Fé

Assinala-se, amanhã, o centenário da liturgia eucarística celebrada a 5 de Julho de 1925, na Basílica de São Pedro, no Vaticano, durante a qual os primeiros mártires coreanos foram proclamados beatos. Falamos de 79 católicos que sofreram o martírio, in odium fidei e em nome da sua fé, durante as célebres perseguições de Gihae (1839) e Byeong-o (1846). Entre eles constava o primeiro padre católico coreano, Andrew Kim Taegon, que fez a formação académica em Macau, tendo conseguido depois entrar na Coreia como missionário. No entanto, treze meses após a sua ordenação, foi morto, à espada, em 1846, com 26 anos de idade. É hoje reconhecido como o santo padroeiro do clero coreano.

Houve cinco grandes perseguições contra cristãos na Coreia ao longo do Século XIX: em 1791, 1801, 1839, 1846 e 1866, tendo perecido nesse período de entre oito a dez mil cristãos. A liberdade religiosa só seria alcançada em 1895.

A perseguição católica de 1866, conhecida na Coreia como “Perseguição Byeong-in”, refere-se à perseguição em larga escala de católicos ocorrida em Joseon, em 1866, sob a regência de Heungseon Daewongun, durante o terceiro ano do reinado do rei Gojong. A perseguição duraria seis anos (até 1872), durante os quais foram executados mais de oito mil leigos e inúmeros missionários da Sociedade para as Missões Estrangeiras de Paris.

O padre Félix-Clair Ridel (1830-1884) – que saíra antes de Joseon para escapar à perseguição de Daewongun – relatou a notícia do martírio de nove missionários franceses ao almirante Pierre-Gustave Roze, comandante da Frota do Extremo Oriente em Tianjin. Roze recusou a oferta de mediação da Dinastia Qing e liderou três navios de guerra com o intuito de retaliar com a maior das forças. Os vasos de guerra passaram por Mapo (Yanghwajin) e Seogang, em finais de Setembro de 1866, atacaram a Ilha Ganghwa e saquearam-na antes de se retirarem em Novembro desse mesmo ano. Furioso com o incidente, Heungseon Daewongun terá afirmado: «– É justo lavar a terra que os bárbaros ocidentais contaminaram com o sangue dos estudiosos orientais», e montou um campo de extermínio em Jamdubong, perto de Yanghwanaru, onde passou a executar católicos. Milhares deles ali morreram. As cabeças decepadas eram lançadas no rio Han, “acumulando-se em montes; e a água do rio Han tornava-se vermelho-sangue”.

Para comemorar a efeméride desta semana, o Comité de Promoção da Memória dos Mártires Coreanos da Arquidiocese de Seul prevê uma série de eventos, começando com uma celebração eucarística já amanhã – presidida pelo arcebispo D. Jeong Soon-taek – no Santuário dos Mártires de Seosomun, a igreja construída no local onde se realizavam as execuções. Um total de 41 dos 79 mártires beatificados no Vaticano a 5 de Julho de 1925 morreram nesse local, considerado “o maior local de martírio da Igreja na Coreia”.

No final da Missa, serão apresentados os “dados sobre a perseguição de Gihae e Byeong-o”. Este relatório contém dados e documentos oficiais relativos às perseguições pertencentes aos “Anais da Dinastia Joseon” – desde o “Diário do Secretariado Real” à “Declaração do Gabinete dos Assuntos Militares” –, cuja compilação foi efectuada com base em comunicações e relatórios trocados entre o Ministério da Justiça e o Departamento de Polícia, o que o diferencia dos materiais históricos existentes, pois centra-se quase exclusivamente nos testemunhos daqueles que viveram nessa época. Além dos textos originais, o estudo inclui também traduções para coreano contemporâneo, facilitando a consulta do acervo por parte dos investigadores.

Para concluir as iniciativas, também amanhã será inaugurada uma exposição, intitulada “Anima Mundi”. Este é também o nome da secção dos Museus do Vaticano que reúne o legado da Exposição Missionária Mundial e que o Papa Pio XI quis criar nos Jardins do Vaticano, por ocasião do Jubileu de 1925.

Nascido em Yangban, Andrew Kim Taegon viu os seus pais serem martirizados por praticarem o Cristianismo, uma actividade absolutamente proibida numa Coreia fortemente confucionista. Depois de ter sido baptizado aos quinze anos de idade, Kim estudou no Seminário em Macau e nas Filipinas, onde hoje é imensamente venerado. Ordenado padre em Xangai, no ano de 1844, pelo bispo francês D. Jean-Joseph-Jean-Baptiste Ferréol, regressaria à Coreia para pregar e evangelizar em locais onde só secretamente se poderia praticar a fé. Kim foi um dos muitos milhares executados durante esse período. Em 1846 foi torturado e, finalmente, decapitado perto de Seul, no rio Han. Foram estas as suas palavras finais: «– Esta é a minha última hora de vida, ouvi-me atentamente: se comuniquei com estrangeiros, foi por causa da minha religião e do meu Deus. É por Ele que morro. A minha vida imortal está prestes a começar. Tornai-vos cristãos se quereis ser felizes depois da morte, porque Deus tem castigos eternos reservados para aqueles que se recusaram a conhecê-Lo».

Joaquim Magalhães de Castro

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