Que caminho trilha a China?
A República Popular da China está a passar por grandes desafios que poderão ditar a consolidação do seu poderio ou a sua queda como grande potência mundial. O tema é bastante delicado porque acima de tudo está a indubitável preocupação das autoridades chinesas em preservar a soberania nacional pela via marítima e terrestre.
Os obstáculos são muitos, até porque se estão por resolver os conflitos nos Mares do Sul e Leste da China, as questões do Tibete e de Taiwan são assuntos encerrados para Pequim, mas não contam com o apoio de outros países, entre os quais dos Estados Unidos.
No caso de Taiwan, será a política “um país, dois sistemas” suficiente para convencer o outro lado do Estreito a assumir-se como parte integrante da Mãe-Pátria? Nos tempos que correm duvido que ganhe força, porque a medida só colherá apoios quando os sistemas políticos de Macau e de Hong Kong estiverem ao nível do que está instituído em Taiwan. Ou seja, a introdução do sufrágio universal directo para a eleição do Chefe do Executivo e dos parlamentares nas duas RAE.
Os receios são muitos por parte do Poder Central, assim como as incertezas. Por um lado, a população de Hong Kong está visivelmente descontente com a governação de CY Leung, virada para o “establishment” e para as poderosas oligarquias que estão a pôr em causa a harmonia social, razão pela qual ganharam força o Occupy Central, a Revolução Guarda-Chuva e a contestação popular à reforma do sistema político preconizada por Pequim.
O descontentamento social cresce a olhos vistos, ao ponto de ter sido anunciado, no espaço de três meses, o segundo partido político favorável à independência da ex-colónia britânica.
Idêntica posição é inconcebível de ganhar adeptos em Macau, porque quem perfilhar de tal sentimento não é digno de pertencer a este território! Até mesmo nós, portugueses, que temos cá parte da nossa História, sabemos muito bem quando se tornou definitivo o virar de página.
Oportunidade perdida
Macau, à imagem do que sucedeu quando legislou o artigo 23º da sua Lei Básica, poderia ser a solução mais adequada às pretensões do Poder Central em avançar com o processo democrático sob características chinesas, o que em abono da verdade daria força a Xi Jinping, porque se o modelo foi amplamente contestado na RAEHK, teria melhor aceitação na RAEM.
Debalde! A secretária para a Administração e Justiça, Sónia Chan, ao anunciar o que vinha aí com a pobre reforma democrática – para todos os efeitos, conta sempre com o prévio beneplácito de Pequim – terá despertado, ou acentuado, sentimentos de descontentamento e de frustração em vários sectores da população, cada vez mais despertos para os actos da governação e para a participação cívica.
Neste particular, os descontentes não são apenas os que dão a cara nas tradicionais manifestações do 1º de Maio e do 1º de Outubro, ou de outras manifestações avulsas, porque seguramente há bastantes mais cidadãos que partilham esses sentimentos, embora sem os tornar públicos. Até um dia!
O meu desejo é que o omnipotente Poder Central esteja atento aos sinais que partem de Macau e de Hong Kong, por forma a encontrar com sapiência o melhor caminho a favor da prosperidade e do progresso, não só deste grandioso país, como do mundo em geral. A RPC pode fazer a diferença!
Semelhanças
O Chefe do Executivo da RAEM, Fernando Chui Sai On, não tem a responsabilidade de apresentar contas à população, porque não foi eleito pelo sufrágio universal directo, mas sim por uma minoria com direito a voto, maioritariamente com ligações às oligarquias e ao “establishment”, que estão longe de representar a vontade popular.
Não julgue o leitor que o fenómeno de não governar para o povo é exclusivo da Grande China (Macau e Hong Kong incluídos), até porque encontro semelhanças no processo “Brexit”, na situação política do Brasil, no “status quo” vigente nos Estados Unidos, etc.
No último caso, descortino muitas semelhanças entre Hillary Clinton e a dupla CY Leung e Chui Sai On, porque caso seja eleita Presidente dos Estados Unidos a ainda presumível candidata do Partido Democrata irá governar para o “establishment” e para as oligarquias, em detrimento do povo.
A grande diferença entre a RPC e esses países – por sinal, ocidentais – é medida por dois factores essenciais: a liberdade de expressão e o facto do povo ter o poder de decidir o rumo dos acontecimentos.
No primeiro caso, a liberdade de expressão é reprimida no continente chinês, algo que para a mentalidade do mundo ocidental só tem comparação com os regimes sanguinários e repressivos que durante o século XX tiveram o seu momento no Velho Continente.
Trata-se de uma percepção errónea, porque em muitas democracias ocidentais a liberdade de expressão também é reprimida por via da constante manipulação de informação na Imprensa e nas redes sociais. Contudo, reconheço haver maior grau de humanidade no Ocidente…
No segundo caso, sabe-se que os Governos ocidentais podem cair em resultado da vontade popular, mas quem geralmente lhes sucede continua na senda da incoerência governativa, por vezes em prejuízo do bem-comum. Mais uma vez, é a (aparente) certeza de poder mudar o rumo dos acontecimentos para melhor que faz com que a generalidade dos ocidentais olhe com grande desconfiança para a realidade da RPC.
Mais uma achega: a propósito dos livreiros de Hong Kong – dois deles alegadamente sequestrados pelos serviços secretos chineses fora da China continental – será que a CIA nunca adoptou o mesmo método fora dos Estados Unidos?
PEDRO DANIEL OLIVEIRA
pedrodanielhk@hotmail.com