A grande festa do futebol foi antecipada e o Benfica sagrou-se campeão pela segunda vez consecutiva.
No Estádio do Guimarães a festa das claques benfiquistas era permanente no “apoio” à sua equipa, lançando-lhes petardos vermelhos, como fogo de artifício a celebrar a alegria de ouvir o apito final. E, no final, foi a apoteose. O Benfica não ganhou, mas era campeão! A euforia dos adeptos transformou-os em invencíveis campeões, lutadores enérgicos contra as cadeiras do estádio e demais equipamentos do Afonso Henriques, cuja inspiração, na sua bravura histórica, acabou eventualmente por motivá-los na apreensão de mercadorias alheias, como se tratasse do espólio devido aos vitoriosos combatentes pelo título.
Fora do recinto, um outro “campeão” da polícia, que não tinha usado o bastão para evitar a arruaça dentro do estádio, que seria o serviço para o qual tinha sido contratado, decidiu mostrar a sua “valentia democrática”, alvejando à bastonada um pai preocupado com a aflição de um filho menor, e ao murro um idoso que pretendia acalmá-lo. Perante as câmaras da televisão, este chefe da polícia ostentou publicamente a sua impreparação para o cargo, exibindo gratuitamente as suas faculdades em boxe e bastonadas contra cidadãos que só queriam defender-se.
Mas a festa benfiquista só estava a começar.
Em Lisboa, nas barbas do severo Marquês de Pombal, sob um manto diáfono avermelhado que coloria os próprios leões, a família benfiquista rejubilou, gritou de alegria, lançou foguetes, dançou, bebeu uns copos de contentamento, mais uns copos para atestar e estavam lançados os ingredientes para começar a contestar. Não se sabe contra quem, nem porquê, mas as garrafas começaram a voar, as pedras pelo ar, as montras e os carros para escangalhar e a polícia… a “levar”.
Gosto de futebol, sem ser doente. Acho que o Benfica mereceu este segundo título, mas não sou benfiquista. Repudio qualquer violência dentro e fora dos estádios, seja ela física ou verbal. Mas acho que a vitória merecida do Benfica deveria ter sido bem festejada, em nome da felicidade que o clube acabava de transmitir aos seus adeptos. Mas se isto é festejar!?…
Assumo a tristeza dos jogadores, da equipa técnica e dirigentes do Benfica, perante este triste espectáculo. Assumo igualmente o receio dos seus muitos milhares de associados: homens, mulheres, famílias inteiras, que passarão a ter medo de se deslocar aos estádios de futebol, com receio de serem agredidos por arruaceiros ou polícias deslumbrados.
Não sou ingénuo ao ponto de considerar que, entre as claques de futebol, ilusoriamente organizadas e controladas, não haja quem lá se encontre com motivações que nada têm a ver com este desporto. Cabe aos clubes, uma vez que lhes atribuem esse estatuto, vigiar de perto essas associações e sancioná-las duramente no caso de cometerem faltas graves, expulsando-os dos estádios.
Da mesma maneira que, no que diz respeito ao papel das autoridades na resolução destes e doutros conflitos, tenho a consciência de que, para alguns, a brutalidade é o único meio de os anular. Razão que tem conduzido a um crescente desrespeito pelas fardas, em que a persuasão é completamente substituída pela coacção, aumentando os provocadores e os desafios abertos à autoridade. E é preciso que os elementos policiais – prevaricadores e incapazes de compreender que a sua verdadeira missão é a segurança do público – não sejam apenas objecto de inquérito sem solução, nem publicação.
A justiça tem de funcionar para os dois lados do problema ou é desacreditada.
Se nada se fizer para conter todos estes excessos e continuarmos a manter os actuais procedimentos, não faltará muito para termos um polícia para cada espectador nos estádios de futebol.
Eu não me preocupo, vejo pela televisão. Não tem o calor humano de um estádio, nem a cor e a excitação dos cânticos e dos aplausos, mas antes estar vivo do que morto!
Luis Barreira