Portugueses, tailandeses e espanhóis em águas francesas

Os últimos dias foram passados a confraternizar com dois casais – um espanhol e outro tailandês – que ancoraram perto de nós, e também com o navegador português José Simões, de que vos falei num dos textos anteriores. Dias de muita conversa e “comezainas” nos três veleiros, todos eles muito diferentes – o nosso de 45 pés e de fibra de vidro, assim como o do navegador português, embora o dele tenha 33 pés e seja dos anos 70. Já o veleiro espanhol é um “tanque de ferro” de 33 pés de comprimento que já esteve várias vezes encalhado em recifes sem que nada lhe acontecesse.

Nas tardes de conversas, copos e presunto, ficámos a saber que o pequeno veleiro português esteve envolvido no evento de comemoração dos 8 Séculos da Língua Portuguesa, realizado no ano passado. Surpreendido por não saber do acontecimento, mais admirado fiquei por ver o logótipo da série de selos dos Correios de Portugal com as bandeiras dos países onde se fala Português sem as cores de Macau, apesar do Instituto Internacional de Macau estar envolvido no acontecimento. É verdade que a RAEM é um território e não um país, mas de qualquer forma as excepções existem para alguma coisa…

Confrontado com esta falha o professor José Simões ficou igualmente surpreendido, sem conseguir dar uma explicação para o sucedido. Ainda assim, foi emitido um pequeno selo onde está representada a bandeira de Macau, pelo que não se compreende porque a mesma não aparece no logótipo do evento.

De facto, eu não tive qualquer conhecimento da comemoração dos oitocentos anos, nem sei se tal foi assinalado em Macau. Mesmo em Portugal a cobertura foi mínima, o mesmo acontecendo em muitos países lusófonos.

O capitão José Simões parou em Cabo Verde e no Brasil e só apenas no país africano foi realizada uma conferência para assinalar o evento. No Brasil – como nos contou – apesar de todos os contactos e esforços feitos, não houve qualquer vontade das autoridades em organizar uma conferência para marcar a passagem do veleiro e os oito séculos da língua que nos unem.

Entre os encontros de amigos lá fui arranjando algum tempo para preparar o Dee com vista à travessia que se aproxima. Iremos rumar às Antilhas Holandesas ou, se a tripulação assim o decidir, seguir mais para Norte, porventura às Ilhas Virgens Britânicas, antes de virar para Oeste antes da época das tempestades.

Temos estado em contacto com os nossos amigos brasileiros, que já se encontram em Curacao depois de uma ida ao Brasil para passarem o Natal e o fim de ano, e ficámos a saber que também eles têm de rumar às Ilhas Virgens Britânicas porque, devido à abrupta desvalorização do Real, ficaram sem dinheiro para seguirem para o Panamá em direcção ao Pacífico. Como também nós lutamos diariamente com falta de apoio financeiro e temos o compromisso de velejar com eles no Pacífico, teremos de esperar até que economizem dinheiro para a viagem. Uma vez no Panamá não haverá forma de voltar atrás. Teremos de poupar dinheiro para a travessia do Canal, que custa a módica quantia de trinta mil patacas. Sem apoios oficiais e apenas com as nossas economias torna-se complicado. Se não recebermos apoio oficial do Governo de Macau, a “epopeia” do Canal estará dependente da venda do nosso apartamento em Macau, o que irá ajudar a suportar a viagem por mais algum tempo.

Neste momento temos duas opções: rumarmos ao Panamá – via Antilhas Holandesas – e ali esperar até conseguirmos pagar a travessia, aproveitando para preparar o veleiro até que chegue o Gentileza; ou rumarmos para Norte, provavelmente até às Ilhas Virgens Britânicas, onde poderemos visitar as ilhas entre Guadalupe e Saint Maarten, que não tivemos a oportunidade de conhecer até agora, e depois reencontrarmo-nos com os amigos brasileiros e juntos planearmos o que fazer quando vier a época das tempestades.

Seja o que for decidido, nesta página irei continuar a partilhar as nossas aventuras e angústias. E por onde quer que andemos, tudo faremos para promover o nome de Portugal, a língua que une vários povos nos cinco continentes e o feito dos nossos antepassados que há cinco séculos chegaram às costas da China, unindo a Europa com o grande Império do Meio, e que as autoridades não quiseram assinalar oficialmente.

JOÃO SANTOS GOMES

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