«Diferenças culturais não podem ferir a unidade do Espírito»

PAPA FRANCISCO REGRESSOU AO MÉDIO ORIENTE PARA VISITA HISTÓRICA AO BAHRAIN

«Diferenças culturais não podem ferir a unidade do Espírito»

O Papa Francisco recordou, na Audiência Geral de quarta-feira, a importância e a urgência de se estabelecer pontes com as outras religiões. O Santo Padre fez um balanço da visita histórica que realizou ao Reino do Bahrain, destinada a promover o diálogo com o Islão e a tomar o pulso à vida da Igreja, num local onde o Catolicismo tem uma feição periférica.

O Papa Francisco expressou esta semana, no Vaticano, o desejo «de que ocorram mais encontros entre cristãos e muçulmanos, que evitem as divisões ideológicas». A posição do Sumo Pontífice foi transmitida aos fiéis na habitual Audiência Geral das quartas-feiras.

O encontro semanal foi, desta feita, inteiramente dedicado à visita que fez ao Bahrain, onde se deslocou a convite do rei Hamed Al Khalifa para marcar presença na edição de 2022 do “Fórum do Bahrain para o Diálogo”, uma iniciativa de natureza inter-religiosa que discutiu o diálogo entre Oriente e Ocidente e o contributo das religiões para a paz, a fraternidade e a compreensão entre os povos.

O Papa Francisco classificou a viagem ao Bahrain como «um novo passo no caminho para a construção de alianças fraternas entre cristãos e muçulmanos».

O Fórum, que juntou no pequeno país insular do Golfo Pérsico líderes religiosos de várias correntes, pautou o reencontro do Santo Padre com o Grande Imã de al-Azhar, Ahmed el-Tayeb, com quem assinou em Abu Dhabi, no ano de 2019, o famoso “Documento sobre a Irmandade Humana para a Paz Mundial e a Coexistência Comum”. Os dois líderes conhecem-se bem e cruzam-se regularmente em cimeiras inter-religiosas, como a que também reuniu em Setembro, no Cazaquistão, dezenas de líderes religiosos.

No encerramento da sua participação no Fórum do Bahrein, Francisco alertou para o distanciamento, cada vez mais evidente, entre o Oriente e o Ocidente. Para ele, são cada vez mais dois blocos opostos, pelo que – avisou – se as grandes potências mundiais continuarem a «brincar com mísseis bombas», o mundo poderá encher-se de «cinzas e ódio». «Depois de duas guerras mundiais, depois de uma guerra fria que durante décadas deixou o mundo em suspenso, no meio de tantos conflitos desastrosos em todas as partes do globo, entre vozes de acusação, ameaça e condenação, ainda nos encontramos a cambalear à beira de um equilíbrio frágil», disse na última intervenção que proferiu na cimeira.

VIAGEM À PERIFERIA DA FÉ

Após o encerramento dos trabalhos do Fórum para o Diálogo, teve lugar a segunda fase a histórica visita do Papa Francisco ao Bahrain, com o Santo Padre a tomar o pulso à vida da Igreja numa das mais improváveis periferias do Catolicismo. Ao contrário do que sucede noutros países da região do Golfo Pérsico, no Bahraino culto público por parte de não-muçulmanos não é proibido. As duas igrejas católicas existentes no País servem uma comunidade com cerca de 160 mil fiéis, na maioria trabalhadores migrantes de nacionalidade filipina e indiana.

O Bahrain é, no entanto, um dos poucos países do Golfo a ter uma população cristã local. Pequena, a comunidade é composta por cerca de um milhar de fiéis, a maioria católicos de origem árabe, que ali chegaram entre 1930 e 1950, tendo posteriormente obtido a cidadania.

Depois de cumprida a agenda política, Francisco participou num encontro ecuménico, com oração pela paz, na catedral de Nossa Senhora da Arábia. Inaugurada no ano passado, num terreno cedido pelo rei, a basílica pode acomodar em simultâneo até dois mil e 300 fiéis, sendo a segunda maior igreja católica romana no Golfo Pérsico.

O outro templo católico existente no pequeno reino – a igreja do Sagrado Coração de Jesus – foi construída em 1939 e goza do estatuto de ser a primeira igreja católica moderna construída na região da Península Arábica, zona que possuía uma forte presença cristã antes da chegada do Islão no Século VII.

No sábado, no terceiro dia da visita papal, cerca de trinta mil pessoas de 111 nacionalidades assistiram à Missa celebrada pelo Pontífice no Estádio Nacional do Bahrain, o maior recinto desportivo do País.

O apelo ao amor, à compreensão e ao diálogo foram as palavras de ordem da homilia, uma intervenção que espelhou a mensagem que o sucessor de Pedro havia deixado aos participantes na edição de 2022 do Fórum do Bahrain para o Diálogo.

No Domingo, Francisco encerrou mais este périplo com uma visita à igreja católica mais antiga do Golfo, onde disse a bispos, padres, religiosas e leigos para se manterem unidos, enquanto divulgam a Boa Nova da Palavra de Deus numa área maioritariamente muçulmana.

Apesar de setenta por cento da população do Bahrain professar a fé islâmica, os católicos e fiéis de outras denominações de matriz cristã gozam de liberdade para professar a sua fé sem limitações. Na realidade, a convivência religiosa é pacífica, mas o Papa não deixou de alertar para outros perigos. Aos líderes católicos locais pediu para evitarem facções, zangas e intrigas, e para salvaguardarem a unidade da Igreja, não obstante as diferenças culturais e linguísticas que separam as diversas comunidades que frequentam a igreja do Sagrado Coração de Jesus. «As divisões mundanas e as diferenças étnicas, culturais e rituais não podem ferir ou comprometer a unidade do Espírito», defendeu.

Marco Carvalho

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