O JEJUM E A PENITÊNCIA NA VIDA DA IGREJA

O JEJUM E A PENITÊNCIA NA VIDA DA IGREJA

Purificação, aperfeiçoamento e combate espiritual

O jejum e a penitência são vias de purificação, aperfeiçoamento e combate espiritual. Jesus, ao deixar-se conduzir pelo Espírito no deserto, para enfrentar a tentação do demónio, revela-nos – dá-nos, na realidade – uma das “armas” espirituais que usou para combater o diabo: o jejum. Já no Século IV, escrevia São Pedro Crisólogo: “O jejum é a alma da oração e a misericórdia é a vida do jejum, portanto, quem reza jejue. Quem jejua tenha misericórdia”.

Na mensagem do Papa Bento XVI para a Quaresma de 2009, o Santo Padre referiu que as Sagradas Escrituras e toda a tradição cristã ensinam que o jejum é de grande ajuda para evitar o pecado e tudo o que a ele induz. Por isso, na História da Salvação é frequente o convite a jejuar. O hoje Papa-emérito, sublinhou que o jejum esteve muito presente na primeira comunidade cristã, e que “também os Padres da Igreja falam da força do jejum, capaz de impedir o pecado, de reprimir os desejos do ‘velho Adão’ e de abrir no coração do crente o caminho para Deus. O jejum é uma prática frequente e recomendada pelos santos de todas as épocas”.

Vendo a necessidade das mortificações, alertou Santa Teresa de Ávila: «O nosso corpo tem este defeito que, quanto mais cuidado e conforto lhe é proporcionado, mais necessidades e desejos encontra».

No Evangelho de Mateus, Jesus deixa claro a importância da prática do jejum, em paralelo com a oração. Assume que quem tem uma vida de oração acompanha-a com o jejum. No Seu ensinamento, deixa também assente que ambos – oração e jejum – devem ser feitos de um modo discreto, com humildade, apenas revelados aos olhos de Deus: «Quando rezardes, não sejais como os hipócritas: gostam de rezar de pé nas sinagogas e nos cantos das praças, para serem vistos pelos homens» (Mateus 6:5). No mesmo capítulo, mais adiante, lê-se: «Tu, porém, quando jejuares, perfuma a tua cabeça e lava o teu rosto, para não mostrares aos homens que jejuas, mas apenas ao teu Pai, que está no escondido; e o teu Pai, que vê no escondido, te recompensará» (Mateus 6:17-18).

O jejum é uma das formas dos fiéis se apresentarem perante Deus com humildade e combaterem o orgulho. Foi pela soberba que o primeiro casal, Adão e Eva, perderam a pureza e caíram no pecado, ofendendo a Deus. O Catecismo da Igreja Católica (CIC) diz-nos que por detrás da opção de desobediência dos nossos primeiros pais há uma voz sedutora, oposta a Deus, a qual, por inveja, nos faz cair na morte: “A Escritura e a Tradição da Igreja vêem neste ser um anjo decaído, chamado Satanás ou Diabo” (CIC nº 391).

A prática do jejum proporciona inúmeros benefícios espirituais, não só no seu propósito como no combate espiritual. Um deles constitui uma das formas indicadas por Deus para nos humilharmos perante Ele. A soberba é tida como a maior barreira para se obter resposta às orações e súplicas. São Lucas Evangelista expõe esta realidade no seu evangelho: «Pois todo o que se exalta será humilhado, e o que se humilha será exaltado» (Lucas 14:11).

Lúcifer, que tinha grande proximidade com Deus, pelo orgulho rebelou-se contra o Criador e condenou-se eternamente. Jesus, ao contrário, mesmo sendo igual ao Pai, humilhou-se até à morte na cruz. Em consequência desta obediência filial, pela via do sofrimento e humilhação redentora, São Paulo afirma: «Por isso, Deus o exaltou à mais alta posição e lhe deu o nome que está acima de todo o nome» (Filipenses 2:9).

O povo judeu, milénios antes de Cristo, já sabia que o jejum – praticado desde o tempo de Moisés – era uma das formas de se humilhar perante Javé.

Já o Antigo Testamento relata que Deus dava ao Seu povo diretrizes para que fosse atendido nas suas súplicas: «Se o meu povo, que chama pelo meu nome, se humilhar e orar, buscar a minha face e se afastar dos seus maus caminhos, dos céus o ouvirei, perdoarei o seu pecado e curarei a sua terra» (2 Crónicas 7:14).

“OBRIGAÇÕES” DOS CATÓLICOS

O Secretariado Nacional de Liturgia publica no seu site oficial informações sobre o jejum e a penitência. A página electrónica refere que em Julho de 1984 a Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), de acordo com o Código de Direito Canónico (cânone 1253), estabeleceu normas para o jejum e a abstinência nas dioceses portuguesas.

No que diz respeito à penitência, é mencionado que na pedagogia da Igreja há tempos em que os cristãos são especialmente convidados à prática da penitência: na Quaresma e em todas as sextas-feiras do ano. “A penitência é uma expressão muito significativa da união dos cristãos ao mistério da Cruz de Cristo. Por isso, a Quaresma, enquanto primeiro tempo da celebração anual da Páscoa, e a sexta-feira, enquanto dia da morte do Senhor, sugerem naturalmente a prática da penitência”.

Sobre o jejum, adianta que é um modo de penitência que consiste na privação de alimentos. E que “na disciplina tradicional da Igreja a concretização do jejum fazia-se limitando a alimentação diária a uma refeição, embora não se excluísse que se pudesse tomar alimentos ligeiros às horas das outras refeições”.

Lembra aos fiéis de que o essencial do espírito da abstinência passa pela escolha de uma alimentação simples e pobre, e à renúncia ao luxo e ao esbanjamento: “Só assim a abstinência será privação e se revestirá de carácter penitencial”.

Neste âmbito, a CEP determina que o jejum e a abstinência são obrigatórios na Quarta-feira de Cinzas e na Sexta-feira Santa. É igualmente mencionado que a abstinência é obrigatória, no decurso do ano, em todas as sextas-feiras que não coincidam com algum dia enumerado entre as solenidades. Tal está pensado para os fiéis a partir dos catorze anos de idade (completos), sendo que aos menores de catorze anos “deverão os pastores de almas e os pais procurar atentamente formá-los no verdadeiro sentido da penitência, sugerindo-lhes outros modos de a exprimirem”.

Quanto ao preceito do jejum, este é obrigatório para os fiéis entre os dezoito anos de idade e os 59 (completos).

As presentes determinações sobre o jejum e a abstinência “apenas se aplicam em condições normais de saúde, estando os doentes, por conseguinte, dispensados da sua observância”.

Segundo a Conferência Episcopal Portuguesa, “é aconselhável que, no cumprimento do preceito penitencial, os cristãos não se limitem a uma só forma de penitência, mas antes as pratiquem todas, pois o jejum, a oração e a esmola completam-se mutuamente, em ordem à caridade”.

Já São Padre Pio afirmara: «ao sofrer, somos capazes de dar algo a Deus. O dom da dor, do sofrimento é uma coisa grande e não pode ser realizada no Paraíso».

Miguel Augusto

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