Experiência missionária e carisma agostiniano poderão marcar Pontificado de Leão XIV

NO ENTENDER DO PADRE JAVIER GONZÁLEZ, E DO PROFESSOR IAN ALABANZA

Experiência missionária e carisma agostiniano poderão marcar Pontificado de Leão XIV

O padre Javier González, OP, considera que o lema do Pontificado de Leão XIV, In Illo uno unum, retirado de um sermão de Santo Agostinho sobre a unidade da Igreja, constitui um dos vários indícios da direcção que o Santo Padre poderá incutir ao seu ministério. O sacerdote, provincial dominicano, esteve esta semana à conversa com O CLARIM. Ouvimos também Ian Alabanza, professor da Universidade de São José.

Entre os dias que mediaram a eleição pelo Conclave e a Missa inaugural do Santo Padre, o Papa Leão XIV foi desvendando o rumo que pretende dar ao seu Pontificado. A escolha do nome papal evoca as raízes da Doutrina Social da Igreja e sugere a continuidade do Papado de Francisco, ao mesmo tempo que aponta para uma Igreja missionária e sinodal, atenta aos desafios da Humanidade.

«No meu entender, o Papa Leão XIV vai, em princípio, dar continuidade ao legado do Papa Francisco – ainda que com um estilo muito mais moderado – no que toca aos problemas com que a Igreja se depara actualmente. O principal foco do Papa, parece-me, poderá estar na renovação do espírito missionário da Igreja, por meio da pregação do Evangelho, mas também numa preocupação genuína com os pobres e os marginalizados», assume o padre Javier González, OP, acrescentado: «Terá também que promover uma sinodalidade mais equilibrada e melhor compreendida, e empenhar-se na proclamação corajosa da Doutrina Social da Igreja, com uma incidência particular no diálogo, na justiça, na paz e num uso construtivo da Comunicação Social e da inteligência artificial, o que por sua vez implica combater os males do relativismo e da superficialidade, tanto dentro como fora da Igreja».

NO ENCALÇO DE SANTO AGOSTINHO – A Ordem de Santo Agostinho, da qual D. Robert Francis Prevost foi prior-geral entre 2001 e 2003, esteve presente em Macau até ao início do Século XIX. Na Ásia e Oceânia, encontra-se actualmente em países como Indonésia, Índia, Coreia do Sul, Papua-Nova Guiné, Filipinas, Japão e Austrália. Faz da pobreza, da castidade, da obediência e do desapego do mundo os pilares fundamentais da sua forma de viver a fé e de promover a evangelização.

«Não tenho dúvidas de que o carisma e a espiritualidade agostiniana, em conjunto com o apoio entusiástico da Ordem de Santo Agostinho, vão guiar e dar o mote ao seu Papado. Na verdade, é isso que temos visto desde o primeiro dia como Bispo de Roma. Não me parece fruto do acaso que as primeiras homilias e os primeiros discursos tenham sido tão profundamente Cristocêntricos, focados na unidade e na paz, com uma perspectiva orientada para a missão e para a devoção a Maria. Todos estes elementos estão em grande medida alinhados com a tradição agostiniana. De outra forma, como poderíamos interpretar que a escolha do Papa Leão XVI para a sua primeira deslocação, fora do Vaticano, tenha sido ao Santuário de Nossa Senhora do Bom Conselho, em Genazzano, que está entregue ao cuidado dos agostinianos desde o Século XIV?», questiona o padre Javier, hoje responsável pelo Priorado de São Domingos e antigo prior provincial do Capítulo da Província Dominicana de Nossa Senhora do Rosário.

«Mesmo no seu brasão de armas» – continua o sacerdote espanhol – «o Papa Leão XIV incorpora vários elementos da espiritualidade agostiniana, como é exemplo o seu próprio mote, In Illo uno unum (“No Deus uno, Somos Um”), que é retirado de um sermão de Santo Agostinho, no Salmo 127. Eu próprio, como dominicano, professo a Regra de Santo Agostinho e sei que a sua principal característica – o amor a Deus e o amor ao próximo, como elementos centrais da vida cristã – vai fazer com que o Papa Leão XIV se afirme como líder compassivo e misericordioso», conclui.

UM NOME, UMA MISSÃO, UMA NOVA ESPERANÇA – Na Missa inaugural do Pontificado, Leão XIV lembrou os povos que sofrem com a guerra, em particular com os conflitos em Gaza, no Myanmar e na Ucrânia. O apelo à paz foi renovado na quarta-feira, no final da primeira Audiência Pública, com o Papa a pedir o fim da guerra e a entrada de ajuda humanitária na Faixa de Gaza, depois de alertar para «a cada vez mais preocupante e dolorosa situação» que se vive no Médio Oriente. As duas intervenções, aliadas ao facto do Santo Padre se ter disponibilizado para acolher no Vaticano a próxima ronda de negociações entre a Rússia e a Ucrânia, indiciam um compromisso duradouro com a promoção da paz.

No entender de Ian Alabanza, o Papa Leão XIV compreende que a “terceira guerra mundial aos pedaços”, que persiste em vários pontos do planeta, é uma das principais ameaças para a Humanidade.

«Na minha perspectiva, um dos maiores desafios que se coloca ao Papa Leão XIV é a forma como pode usar a sua influência para tentar colocar fim aos muitos conflitos que grassam no mundo e impedir que novos conflitos despontem», afirma ao nosso jornal o professor assistente da Faculdade de Estudos Religiosos e Filosofia da Universidade de São José.

Segundo este académico filipino, «o Papa terá que transmitir uma mensagem forte e consistente em prol da tolerância e da humildade; terá que convencer as pessoas a abandonar o ódio e a desconfiança para com os outros; terá que desafiar o abuso da autoridade; e terá que ser um defensor da verdade, de forma a esclarecer as pessoas e impedir que outros usem a desinformação e a propaganda para envenenar as suas mentes e as manipular. Só assim se evita que tomem decisões com base nos seus medos e não no respeito e amor pelo próximo».

Marco Carvalho

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