Filosofia, uma dentada de cada vez (66)

As boas intenções são suficientes para fazer uma boa acção?

Já estudámos as normas objectivas (a lei moral) e subjectivas (a consciência) da moralidade. A próxima pergunta é: quais os aspectos da acção (“acção” pode significar “pensamentos”, “desejos”, “atitudes”) que deverá a consciência examinar para determinar se uma acção é boa ou má? Se uma pessoa pensa “bem”, se a sua intenção ou motivação (em Latim, finis operantis) é boa, será suficiente para classificar uma acção como “boa”? Algo mais ou menos como isto: se alguém tirar o meu dinheiro, sem me pedir, mesmo que a sua intenção seja a de ajudar alguém necessitado, consideraríamos essa acção como boa? Talvez não. São Bernardo de Clairvaux (1090-1153) disse: “L’enfer est plein de bonnes volontés ou désirs” (“O inferno está cheio de boas intenções ou desejos”). Então, se as boas intenções não são suficientes, que outros elementos de uma acção deverão ser tidos em conta?

(1) A acção em si parece ser importante para se determinar se um acto é bom ou mau. Por exemplo, se alguém tira o meu dinheiro sem pedir a minha autorização, eu considerarei a sua acção como “má”, mesmo que seja para dar o meu dinheiro a alguém necessitado. Assim sendo, para além da intenção da pessoa, a acção em si também deve ser considerada. Na ética este facto é denominado de (moral) objecto ou finalidade da acção (em Latim, finis operis). O fim ou objecto é a principal determinante de uma acção, a primeira coisa que necessitamos considerar quando julgamos o bom ou mal de um acto.

(2) E o que há a respeito da intenção? Como é que esta afecta a nossa acção? A intenção da pessoa ao agir (finis operantis) pode tornar a acção mais ou menos boa ou mais ou menos má. No entanto, uma boa intenção nunca poderá tornar boa uma acção que é em si mesma má.

A moralidade de uma acção (finis operis) é afectada pela intenção (finis operantis). Por exemplo, dar esmolas para dar nas vistas é diferente de dar uma esmola a outra pessoa para ajudar outrem. E ambas são diferentes do acto de dar esmolas para glória de Deus. A primeira acção talvez não seja tão boa assim, a segunda é melhor, mas a terceira acção é a melhor das três.

3) Temos também que considerar as circunstâncias que rodeiam a acção. As circunstâncias incluem “quem”, “o quê”, “quando” e “como”.

Em alguns casos precisamos de considerar quem está a realizar a acção. É diferente se a pessoa que mente é uma criança ou um membro do Governo. Não é a mesma coisa matar um homem que se pode defender a si próprio ou assassinar um bebé indefeso no ventre materno.

Também devemos perguntar a quem o acto é destinado (dirigido). É diferente roubar vinte patacas a um milionário e a mesma quantia a um pobre esmoler.

Devemos perguntar o que está envolvido (a quantidade ou qualidade do objecto). Por exemplo, roubar objectos sagrados é mais grave do que roubar algo que não é usado na adoração (ou oração), mesmo que ambos tenham o mesmo valor monetário.

Quando, ou por quanto tempo determinado acontecimento durou, também afecta a bondade e a maldade de uma acção. Estar zangado com uma pessoa por alguns momentos não é o mesmo que ficar zangado durante cinco dias.

Onde a acção teve lugar poderá alterar a moralidade do acto. Um pecado cometido em público é diferente de um pecado cometido em privado.

Os meios usados ou a forma como a acção foi efectuada também afecta a acção. Pode-se corrigir uma outra pessoa tanto rudemente como com gentileza.

Outras circunstâncias também podem alterar a bondade de uma acção. Por exemplo: trabalhar é uma boa acção, mas trabalhar mesmo quando as circunstâncias não são as mais propícias (exemplo: o tempo está quente, alguém esta sonolento ou cansado, ou tem um patrão irrazoável) dá mais valor à acção em si.

Pe. José Mario Mandía

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