Fé e sociedade
Seria a vida em sociedade mais humana se não houvesse religiões?
Para algumas pessoas a resposta é um rotundo sim.
A religião parece ser uma fonte de discórdia, de violência e de falta de tolerância. Não parece trazer nada de útil para a vida social.
Se ninguém acreditasse em Deus, a vida nesta Terra parece que seria muito mais humana.
Esta visão – lugar-comum bastante difundido – é simplista, superficial, pouco séria e nada científica.
Estou plenamente de acordo com Sacks – grande rabino das congregações judias da Commonwealth – quando diz que uma sociedade, a longo prazo, não pode sobreviver sem a presença da fé religiosa em muitos dos seus membros.
A religião, para aqueles que não acreditam em Deus, pode parecer algo supérfluo que tenderia a desaparecer com o aumento do conhecimento científico.
Se quero explicar o mundo já não preciso da Bíblia – tenho a ciência!
Se quero controlar o mundo já não preciso rezar – tenho a tecnologia!
Se quero o desenvolvimento económico já não preciso da ajuda de Deus – tenho os mercados!
No entanto, porque é que, apesar de tanto conhecimento científico, ainda há religiões no século XXI?
Talvez a religião sobreviva porque responde a perguntas nada científicas mas profundamente necessárias:
Quem sou eu? De onde é que eu venho? Para onde é que eu vou? Qual o motivo da minha existência?
Já sei que fui criado para ser feliz, mas o que é que eu faço com o sofrimento quando ele aparece? Meto a cabeça na areia? Ponho a minha fé na ciência, na tecnologia e nos mercados?
É difícil tentar construir algo de sólido na vida – começando pela própria felicidade – sem tentar dar uma resposta minimamente satisfatória a estas perguntas.
A religião e a ciência não são inimigas: são complementares!
Necessitamos da ciência para nos explicar o modo como funciona o universo. E necessitamos da religião para nos explicar porque é que ele existe, que fim tem e quem o construiu à medida do homem.
Além disso, sem crenças religiosas sérias, as pessoas perdem com muito mais facilidade um conceito fundamental para a vida social: o conceito de moralidade.
É muito fácil que desapareçam as noções de bem e de mal uma vez que a pergunta sobre o bem é, na sua essência, uma pergunta religiosa.
Tudo se torna relativo. Desaparecem os valores absolutos. Substitui-se o bem e o mal pelo correcto e o incorrecto.
É verdade que uma pessoa pode viver sem religião, mas isso não é o mesmo que dizer que uma sociedade possa viver sem referências morais.
Sem elas, a sociedade fragmenta-se. Desaparece – com muita facilidade – a atitude altruísta de querer ajudar os outros sem receber nada em troca.
Termino com uma comparação que também é feita por Sacks:
Uma sociedade sem fé é como uma sociedade sem arte, sem música e sem beleza.
Parecem realidades supérfluas – mas não o são!
Pe. Rodrigo Lynce de Faria
Doutor em Teologia