Cinco indicações para o caminho ecuménico

Quando o avião está em voo parece lento.

Observando o último meio século de compromisso ecuménico, a primeira comparação que me vem à mente é com uma viagem de avião. Depois de preparativos prolongados, ela tem início com um rolamento muito veloz na pista e depois uma descolagem também rápida. Quando se alcança a altitude correcta e o avião flutua no ar, é fácil ter a impressão de que já não nos movemos, ou pelo menos de que o fazemos muito lentamente. Todavia, todos os passageiros deveriam ter a esperança de que o avião certamente chegará ao destino. No que diz respeito ao compromisso da Igreja Católica pela unidade entre os cristãos, o Concílio Vaticano II foi o rolamento veloz na pista, com o qual a Igreja encontrou uma nova atitude face ao movimento ecuménico. Mas depois de mais de cinquenta anos, ainda continuamos, por assim dizer, a mover-nos no ar, ou pelo menos, assim pode parecer a muitos. Contudo, permanece a esperança legítima de que também o avião ecuménico certamente pousará. Isto é ainda mais válido se pensarmos no verdadeiro piloto, o Espírito Santo, que fez com que esta viagem começasse e que seguramente a levará à meta.

Na época a proclamação do Vaticano II suscitou grandes esperanças e em muitas pessoas alimentou a expectativa de uma iminente unidade dos cristãos. Entretanto, emergiu claramente que o caminho ecuménico é mais longo e até mais difícil de quanto então se pensasse. Por conseguinte é oportuno deixar a imagem da viagem aérea a fim de passar para o caminho terreno, e mais precisamente para o caminho dos discípulos rumo a Emaús, perguntando-nos o que nos pode dizer nos próximos passos rumo à reconciliação ecuménica.

Em primeiro lugar é preciso levar a sério a imagem do caminho. Na actual situação ecuménica é fundamental que os cristãos, homens e mulheres que vivem em comunidades cristãs diversas, estejam a caminho juntos na estrada rumo à unidade e façam juntos tudo o que for possível. A experiência ecuménica ensina-nos que a unidade cresce no caminhar e que estar a caminho juntos significa já praticar a unidade. Esta perspectiva é muito apreciada sobretudo pelo Papa Francisco, que expressou a sua convicção ecuménica com as significativas palavras: «É que a unidade não virá como um milagre no fim: a unidade vem no caminho, fá-la o Espírito Santo no caminho» (Homilia na solenidade da conversão de São Paulo apóstolo, celebração das vésperas, 25 de Janeiro de 2014). É esta a perspectiva que hoje deve ser aprofundada e, sobretudo, vivida concretamente. Estar a caminho juntos: esta é a primeira indicação que nos oferece a narração profunda tirada do capítulo pascal de Lucas.

O caminho dos discípulos rumo a Emaús, sem dúvida não é uma excursão de lazer. Aliás, os discípulos estão cheios de tristeza pelo que aconteceu em Jerusalém e falam entre si e com o acompanhante desconhecido sobre o que não lhes dá paz. E assim nos é oferecida uma segunda indicação para o caminho: o ecumenismo autêntico vive na participação recíproca na vida dos outros, na alegria e na dor, assim como o expressou Paulo com esta bonita imagem: «Se um membro sofre, todos os membros padecem com ele; e se um membro é tratado com carinho, todos os outros se congratulam por ele. Ora, vós sois o corpo de Cristo e cada um, por sua parte, é um dos seus membros (1 Cor 12, 26-27)». Actualmente, uma demonstração particular desta regra de vida da comunhão ecuménica consiste no triste facto que devemos assistir a perseguições de cristãos numa medida que é única na história. Hoje os cristãos não são perseguidos porque protestantes ou pentecostais, ortodoxos ou católicos, mas porque são cristãos. Hoje o martírio é ecuménico, e devemos falar de um verdadeiro ecumenismo dos mártires ou de um ecumenismo de sangue. Com efeito, no mundo actual o sangue de tantos mártires não divide, mas une.

Na percepção desta realidade está inserido um grande desafio, que o Papa Francisco expressou com a memorável frase: «Se o inimigo nos une na morte, quem somos nós para nos dividir na vida?» (Discurso ao movimento da Renovação no Espírito, 3 de Julho de 2015). Efectivamente, não é humilhante que quantos perseguem os cristãos às vezes têm uma visão ecuménica melhor do que nós cristãos? Vejo na experiência da perseguição e do martírio, comum a todos os cristãos, o sinal mais convincente do ecumenismo hoje. Mas na Europa isto é deveras levado a sério suficientemente?

Na troca de experiências de sofrimento, no caminho de Emaús os discípulos procuravam uma palavra libertadora e deixaram que lhes fosse oferecida pelo desconhecido companheiro de viagem, o qual lhes explicava a Sagrada Escritura. Disto emerge a terceira indicação, que consiste no facto de que nós cristãos nos aproximamos mais uns dos outros quando ouvimos juntos a palavra de Deus e falamos sobre ela juntos. A Reforma e o consequente cisma no século XVI estavam ligados a uma interpretação controversa da Bíblia e chegaram até à Sagrada Escritura. Portanto, também a superação da divisão e o restabelecimento da unidade só podem tornar-se possíveis na via de uma leitura comum da Sagrada Escritura. Quanto mais nos imergirmos no mistério de Jesus Cristo e da sua palavra, mais conseguiremos encontrar o caminho que nos leva aos outros.

Certamente, aos discípulos de Emaús os olhos só se abriram quando o Senhor partiu o pão juntamente com eles, despertando assim no seu coração um profundo desejo de unidade. Portanto, a quarta indicação é a compreensão de que nós, humanos, não podemos obter a unidade sozinhos, nem decidirmos a forma e o tempo, mas só pedirmos que ela nos seja doada. Nós, homens, podemos criar divisão: demonstram-nos quer a história quer o presente. A unidade só podemos recebê-la, orientando-nos para a vontade de Jesus e apresentando-lhe este desejo na oração. No início do movimento ecuménico houve a introdução da semana de oração pela unidade dos cristãos. Desde o princípio tratou-se de um movimento de oração, e só como tal permanecerá no caminho. A oração pela unidade dos cristãos é e continua a ser o coração pulsante de todo o caminho ecuménico.

Depois do encontro pessoal com o Senhor ressuscitado, os discípulos puseram-se de novo a caminho: «E partiram sem demora». Eis, no sentido literal, a quinta indicação para o caminho: os cristãos, que no encontro com Cristo descobrem também a unidade entre si, não permaneçam comodamente sentados, mas ponham-se a caminho e, como os discípulos, anunciem o que conheceram, bem cientes de que a credibilidade do seu testemunho não depende substancialmente do facto que se superam uns aos outros, mas que caminham juntos. Como cristãos a nossa preocupação por um bom futuro da Europa só será ouvida se a testemunharmos em comunhão ecuménica e a enchermos de vida.

Kurt Koch

In L’Osservatore Romano

 

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